V. I. Lénine
Novembro de 1910
O tema indicado no título é abordado nos artigos de Trótski e Mártov nos nº 50 e 51 da Neue Zeit(1). Mártov expõe as concepções do menchevismo(2). Trótski segue na esteira dos mencheviques, encobrindo-se com uma fraseologia particularmente sonora. Para Mártov a «experiência russa» reduz-se a que «a incultura blanquista(3) e anarquista venceu a cultura marxista» (leia-se: o bolchevismo venceu o menchevismo). «A social-democracia russa falava russo demasiado zelosamente», diferentemente dos meios da táctica «europeus gerais». A «filosofia da história» de Trótski é a mesma. A causa da luta é «a adaptação da intelectualidade marxista ao movimento de classe do proletariado». Coloca-se em primeiro plano «o espírito sectário, o individualismo intelectual, o fetichismo ideológico». «A luta pela influência sobre o proletariado politicamente imaturo» — eis o fundo da questão.
I
A teoria que vê na luta do bolchevismo contra o menchevismo uma luta pela influência sobre o proletariado imaturo não é nova. Encontramo-la desde 1905 (se não desde 1903) em incontáveis livros, brochuras e artigos da imprensa liberal. Mártov e Trótski oferecem aos camaradas alemães concepções liberais retocadas de modo marxista.
O proletariado russo está certamente muito menos maduro politicamente que o da Europa ocidental. Mas de todas as classes da sociedade russa foi precisamente o proletariado que revelou, em 1905-1907, maior maturidade política. A burguesia liberal russa que no nosso país se comportou de maneira tão infame, cobarde, estúpida e traidora como a burguesia alemã em 1848, odeia o proletariado russo precisamente porque ele se mostrou em 1905 suficientemente maduro politicamente para arrancar a essa burguesia a direcção do movimento, para desmascarar impiedosamente a traição dos liberais.
É uma «ilusão» pensar — declara Trótski — que o menchevismo e o bolchevismo «lançaram raízes profundas nas profundezas de proletariado».
Este é um exemplo das frases sonoras mas ocas em que é mestre o nosso Trótski. Não é nas «profundezas do proletariado» mas no conteúdo económico da revolução russa que residem as raízes da discrepância entre mencheviques e bolcheviques. Ignorando esse conteúdo, Mártov e Trótski privaram-se da possibilidade de compreender o sentido histórico da luta dentro do partido na Rússia. A questão não está em saber se as formulações teóricas das divergências penetraram «profundamente» numas ou noutras camadas do proletariado mas em que as condições económicas da revolução de 1905 colocaram o proletariado em relações hostis com a burguesia liberal — não apenas por causa da questão da melhoria do modo de vida dos operários mas também por causa da questão agrária, por causa de todas as questões políticas da revolução, etc. Falar da luta de tendências na revolução russa distribuindo rótulos — «sectarismo», «incultura», etc. — e não dizer palavra sobre os interesses económicos fundamentais do proletariado, da burguesia liberal e do campesinato democrático significa descer ao nível dos jornalistas de baixo quilate.
Eis um exemplo.
«Em toda a Europa Ocidental», escreve Mártov, «as massas camponesas só são consideradas válidas para a aliança (com o proletariado) na medida em que travam conhecimento com as duras consequências da transformação capitalista da agricultura; ao passo que na Rússia se desenhou o quadro da união de um proletariado numericamente fraco com 100 milhões de camponeses que ainda não sofreram, ou quase não sofreram, a acção “educadora” do capitalismo e por isso não passaram ainda pela escola da burguesia capitalista.»
Isto não é um lapso de Mártov. É o ponto central de todas as concepções do menchevismo. A história oportunista da revolução russa, que se publica na Rússia sob a redacção de Potréssov, Mártov e Máslov (O Movimento Social na Rússia no Princípio do Século XX) está inteiramente impregnada destas ideias. O menchevique Máslov exprimiu essas ideias com maior relevo ainda, ao afirmar num artigo de resumo dessa «obra»:
«A ditadura do proletariado e do campesinato contradiria todo o curso do desenvolvimento económico.» É precisamente aqui que se deve procurar as raízes das divergências entre o bolchevismo e o menchevismo.
Mártov substituiu a escola do capitalismo pela escola da burguesia capitalista (diga-se entre parênteses: não existe no mundo outra burguesia além da capitalista). Em que consiste a escola do capitalismo? Em que ele arranca os camponeses à idiotia camponesa, os sacode e os empurra para a luta. Em que consiste a escola da «burguesia capitalista»? Em que «a burguesia alemã de 1848 trai sem o menor escrúpulo os camponeses, os seus mais naturais aliados, sem os quais ela é importante contra a nobreza» (K. Marx na Nova Gazeta Renana de 29 de Julho de 1848(4)). Em que a burguesia liberal russa em 1905-1907 traiu sistemática e continuamente os camponeses, passou na prática para o lado dos latifundiários e do tsarismo contra os camponeses em luta, entravou directamente o desenvolvimento da luta camponesa.
A coberto de boas palavras «marxistas» sobre a «educação» dos camponeses pelo capitalismo, Mártov defende a «educação» dos camponeses (que lutam revolucionariamente contra a nobreza) pelos liberais (que traíram os camponeses à nobreza).
Isto é substituir o marxismo pelo liberalismo. Isto é embelezar o liberalismo com frases marxistas. As palavras de Bebel em Magdeburgo(5), segundo as quais entre os sociais-democratas existem nacionais-liberais, são verdadeiras não apenas em relação à Alemanha.
É necessário observar ainda que a maioria dos chefes ideológicos do liberalismo russo se educaram na literatura alemã e transpõem particularmente para a Rússia o «marxismo» brentaniano e sombartiano(6), que reconhece a «escola do capitalismo» mas nega a escola da luta de classe revolucionária. Todos os liberais contra-revolucionários na Rússia, Struve, Bulgákov, Frank, Izgoev e Cª, ostentam semelhantes frases «marxistas».
Mártov compara a Rússia da época das insurreições camponesas contra o feudalismo com a «Europa Ocidental», que há já muito tempo pôs fim ao feudalismo. Trata-se de uma deturpação colossal da perspectiva histórica. Haverá «em toda a Europa Ocidental» socialistas em cujo programa exista a reivindicação de «apoiar as acções revolucionárias do campesinato até à confiscação dos latifúndios»(7)? Não. «Em toda a Europa Ocidental» os socialistas de modo nenhum apoiam os pequenos proprietários na sua luta pela posse da terra contra os grandes proprietários. Em que consiste a diferença? Em que «em toda a Europa Ocidental» há muito que se constituiu e definiu definitivamente o regime burguês, particularmente as relações agrárias burguesas, enquanto na Rússia está em curso precisamente agora uma revolução em torno da forma que esse regime burguês assumirá. Mártov repete o estafado método dos liberais, que opõem sempre a um período de conflitos revolucionários em torno de uma dada questão períodos em que não há conflitos revolucionários pois a própria questão está desde há muito resolvida.
A tragicomédia do menchevismo consiste precisamente em que foi forçado, durante a revolução, a adoptar teses incompatíveis com o liberalismo. Se nós apoiamos a luta do «campesinato» pela confiscação das terras, isso significa que reconhecemos a vitória como possível, como económica e politicamente vantajosa para a classe operária e para todo o povo. Ora a vitória do «campesinato», dirigido pelo proletariado, na luta pela confiscação das terras dos latifundiários é precisamente a ditadura revolucionária do proletariado e do campesinato. (Recordemos as palavras de Marx em 1848 sobre a necessidade da ditadura na revolução e as justas zombarias que Mehring fazia daqueles que acusavam Marx de querer realizar a democracia através da instauração de uma ditadura(8).)
É radicalmente errada a concepção segundo a qual a ditadura destas classes «contradiz todo o curso do desenvolvimento económico». É precisamente o contrário. Só essa ditadura poderia liquidar todas as sobrevivências do feudalismo, asseguraria o mais rápido desenvolvimento das forças produtivas. Pelo contrário, a política dos liberais coloca tudo nas mãos dos agrários ricos russos, que retardam cem vezes «a marcha do desenvolvimento económico» da Rússia.
Em 1905-1907 revelou-se completamente a contradição entre a burguesia liberal e o campesinato. Na Primavera e no Outono de 1905, e também na Primavera de 1906, as insurreições camponesas abarcaram entre um terço e metade dos uézds(1*) da Rússia central.
Os camponeses destruíram cerca de 2000 propriedades latifundiárias (infelizmente, isto não é mais de 1/15 do que se devia destruir). Só o proletariado ajudou sem reservas essa luta revolucionária, orientou-a de todos os modos, dirigiu-a, uniu-a com as suas greves de massas. A burguesia liberal não ajudou nunca, nem uma única vez, a luta revolucionária, preferindo «acalmar» os camponeses e «reconciliá-los» com os latifundiários e com o tsar. Depois disso, nas duas primeiras Dumas(9) (1906 e 1907) o mesmo se repetiu na cena parlamentar. Os liberais entravaram constantemente a luta dos camponeses, traíram-nos, e só os deputados operários dirigiram e apoiaram os camponeses contra os liberais. A luta dos liberais contra os camponeses e os sociais-democratas enche toda a história da I e da II Dumas. A luta do bolchevismo e do menchevismo está indissoluvelmente ligada a essa história, como luta quanto ao apoio dos liberais, quanto à liquidação da hegemonia dos liberais sobre o campesinato. Por isso, explicar as nossas cisões pela influência dos intelectuais, pela imaturidade do proletariado, etc., é uma repetição puerilmente ingénua das fábulas dos liberais.
Por essa mesma razão é radicalmente errado o raciocínio de Trótski segundo o qual as cisões na social-democracia internacional são suscitadas «pelo processo de adaptação da classe socialmente revolucionária às condições limitadas (estreitas) do parlamentarismo», etc., e na social-democracia russa pela adaptação da intelectualidade ao proletariado.
«Tão limitado (estreito) foi», escreve Trótski, «do ponto de vista do objectivo final socialista, o conteúdo político real desse processo de adaptação, como descomedidas foram as suas formas e grande a sombra ideológica projectada por esse processo.»
Esta verborreia verdadeiramente «descomedida» é apenas a «sombra ideológica» do liberalismo. Tanto Mártov como Trótski misturam num mesmo monte períodos históricos heterogéneos opondo a Rússia, que está a realizar a sua revolução burguesa, à Europa, que há muito terminou essas revoluções. Na Europa, o conteúdo político real do trabalho social-democrata é a preparação do proletariado para a luta pelo poder contra a burguesia, que domina já completamente o Estado. Na Rússia trata-se ainda apenas de criar um Estado burguês moderno, o qual se assemelhará a uma monarquia dos latifundiários (em caso de vitória do tsarismo sobre a democracia) ou a uma república camponesa democrática burguesa (em caso de vitória da democracia sobre o tsarismo). E a vitória da democracia na Rússia actual só é possível no caso de as massas camponesas seguirem o proletariado revolucionário e não o liberalismo traidor. Esta questão ainda não está historicamente resolvida. As revoluções burguesas na Rússia ainda não estão terminadas, e nesses limites, isto é, nos limites da luta por uma forma de regime burguês na Rússia, o «conteúdo político real» do trabalho dos sociais-democratas russos é menos «limitado» do que nos países onde não há qualquer luta pela confiscação pelos camponeses das terras dos latifundiários, onde as revoluções burguesas estão concluídas há muito.
É fácil compreender por que é que os interesses de classe da burguesia levam os liberais a querer convencer os operários de que o seu papel na revolução é «limitado», de que a luta de tendências é suscitada pela intelectualidade e não pelas profundas contradições económicas, de que o partido operário deve ser «não hegemónico na luta de libertação mas um partido de classe». Tal é precisamente a fórmula apresentada nos últimos tempos pelos liquidacionistas—golossistas(2*) (Levítski no Nacha Zariá)(10) e aprovada pelos liberais. A expressão «partido de classe» é por eles entendida no sentido brentaniano—sombartiano: preocupai-vos apenas com a vossa própria classe e abandonai os «sonhos blanquistas» de dirigir todos os elementos revolucionários do povo na luta contra o tsarismo e o liberalismo traidor.
II
As reflexões de Mártov sobre a revolução russa e de Trótski sobre a situação actual da social-democracia russa são confirmações concretas do carácter erróneo das suas concepções fundamentais.
Comecemos pelo boicote. Mártov chama ao boicote uma «abstenção política», um método de «anarquistas e sindicalistas»(11), e fala aliás apenas de 1906. Trótski diz que «a tendência boicotista atravessa toda a história do bolchevismo — boicote dos sindicatos, da Duma de Estado, da auto-administração local, etc.», que é «um produto do receio sectário de se afundar nas massas, o radicalismo do abstencionismo intransigente», etc. No que se refere ao boicote aos sindicatos e à administração local, Trótski diz uma flagrante mentira. É igualmente mentira que o boicotismo se estenda através de toda a história do bolchevismo; o bolchevismo constituiu-se completamente, como corrente, na Primavera e no Verão de 1905, antes de surgir pela primeira vez a questão do boicote. O bolchevismo declarou em Agosto de 1906 no órgão oficial da fracção que tinham passado as condições históricas que tornavam necessário o boicote.
Trótski deturpa o bolchevismo porque Trótski nunca conseguiu assimilar ideias minimamente definidas sobre o papel do proletariado na revolução burguesa russa.
Mas ainda muito pior é a deturpação da história dessa revolução. Se se fala de boicote, deve-se começar pelo princípio e não pelo fim. A primeira (e única) vitória na revolução foi arrebatada pelo movimento de massas que decorreu sob a palavra de ordem de boicote. Esquecê-lo só aproveita aos liberais.
A lei de 6 (19) de Agosto de 1905 criou a Duma de Bulíguine(12) como instituição consultiva. Os liberais, até os mais à esquerda, decidiram participar nela. A social-democracia decidiu por enorme maioria (contra os mencheviques) boicotar essa Duma e chamar as massas à investida directa contra o tsarismo, à greve de massas e à insurreição. Por conseguinte, a questão do boicote não era apenas uma questão no interior da social-democracia. Era uma questão da luta do liberalismo contra o proletariado. Toda a imprensa liberal de então mostra que os liberais receavam o desenvolvimento da revolução e orientavam todos os seus esforços para um «acordo» com o tsarismo.
Quais eram as condições objectivas para a luta de massas directa? A melhor resposta para isto é dada pela estatística das greves (divididas em económicas e políticas) e do movimento camponês. Apresentamos os dados mais importantes que nos permitirão ilustrar toda a exposição subsequente.
Estes números mostram-nos que energia gigantesca o proletariado é capaz de desenvolver na revolução. Em todo o decénio que precedeu a revolução o número de grevistas na Rússia foi de apenas 431 000, isto é, em média 43 000 por ano, enquanto em 1905 o número total de grevistas atingiu 2 863 000, sendo o total dos operários fabris de l 661 000! O mundo nunca vira ainda semelhante movimento grevista. No 3.° trimestre de 1905, quando surgiu pela primeira vez a questão do boicote, vemos precisamente o momento de transição para uma nova onda, muito mais forte, do movimento grevista (e na sua sequência, do movimento camponês). Ajudar o desenvolvimento dessa onda revolucionária, orientando-a para o derrubamento do tsarismo, ou permitir ao tsarismo distrair a atenção das massas com o jogo da Duma consultiva — tal era o conteúdo histórico real da questão do boicote. Pode-se pois avaliar até que ponto foram triviais e néscios os esforços liberais de ligar o boicote na história da revolução russa ao «abstencionismo político», ao «sectarismo», etc! Sob a palavra de ordem de boicote, adoptada contra os liberais, desenvolveu-se um movimento que elevou o número dos grevistas políticos de 151 000 no 3.° trimestre de 1905 para um milhão no 4.° trimestre de 1905.
Mártov declara como «causa principal» do êxito das greves de 1905 «a crescente corrente oposicionista em amplos círculos da burguesia». «A influência dessas amplas camadas da burguesia ia tão longe que elas, por um lado, incitavam directamente os operários às greves políticas», e por outro, persuadiam os industriais a «pagar aos operários o salário pelo tempo da greve» (sublinhado de Mártov).
A esta adocicada celebração da «influência» da burguesia nós opomos a seca estatística. Em 1905 as greves terminavam mais frequentemente, em comparação com 1907, com vantagem para os operários. Eis os dados para aquele ano: 1 438 610 grevistas apresentaram reivindicações económicas; 369 304 operários venceram a luta, 671 590 terminaram-na por um compromisso, 397 716 perderam. Essa foi na realidade (e não segundo as fábulas liberais) a «influência» da burguesia. Mártov deturpa de maneira perfeitamente liberal a verdadeira atitude do proletariado para com a burguesia. Os operários venceram (tanto na «economia» como na política) não porque a burguesia pagou por vezes as greves ou teve uma atitude de oposição, mas a burguesia fez oposição e pagou porque os operários venceram. A força da pressão de classe, a força de milhões de grevistas, das agitações camponesas e das sublevações militares, tal é a causa, a «causa principal», caríssimo Mártov; a «simpatia» da burguesia é uma consequência.
«O 17 de Outubro(13), escreve Mártov, «abrindo perspectivas de eleições para a Duma e criando a possibilidade de convocar reuniões, de constituir associações operárias, publicar jornais sociais-democratas, mostrava a direcção em que se deveria conduzir o trabalho.» Mas a infelicidade esteve em que «não ocorreu a ninguém a ideia da possibilidade de uma "estratégia de desgaste". Todo o movimento foi artificialmente empurrado para um conflito sério e decisivo», isto é, para a greve de Dezembro e para a «derrota sangrenta»(14) de Dezembro.
Kautsky discutiu com R. Luxemburg sobre se na Alemanha teria ou não chegado, na Primavera de 1910, o momento da passagem da «estratégia de desgaste» à «estratégia de derrubamento», dizendo Kautsky clara e abertamente que essa passagem é inevitável havendo um maior desenvolvimento da crise política. Quanto a Mártov, agarrando-se a Kautsky, prega a despropósito a «estratégia de desgaste» no momento de maior agudização da revolução. Não, caro Mártov, você repete simplesmente os discursos liberais. O 17 de Outubro não «abriu» as «perspectivas» de constituição pacífica, isso é uma fábula liberal, abriu a guerra civil. Essa guerra foi preparada não pela vontade subjectiva de partidos ou grupos, mas por toda a marcha dos acontecimentos desde Janeiro de 1905. O manifesto de Outubro não assinalava o fim da luta mas o equilíbrio das forças em combate: o tsarismo já não podia governar, a revolução ainda não podia derrubá-lo. Desta situação decorria de modo objectivamente inevitável um combate decisivo. A guerra civil era, tanto em Outubro como em Novembro, um facto (enquanto as «perspectivas» pacíficas eram uma mentira liberal); essa guerra exprimiu-se não apenas nos pogromes mas também na luta das forças armadas contra as unidades insubmissas do exército, contra os camponeses de um terço da Rússia, contra as periferias. As pessoas que, em tais condições, consideram «artificial» a insurreição armada e a greve de massas de Dezembro só artificialmente podem ser consideradas sociais-democratas. O partido natural para tais pessoas é o partido liberal.
Marx disse em 1848 e em 1871 que há momentos numa revolução em que a entrega de posições ao inimigo sem combate desmoraliza mais as massas do que a derrota na luta(15). Dezembro de 1905 não foi apenas esse momento na história da revolução russa. Dezembro foi o culminar natural e inevitável dos choques e combates de massas que cresceram em todos os recantos do país ao longo de 12 meses. Isto é testemunhado até pela seca estatística. O número dos grevistas puramente políticos (isto é, que não apresentavam quaisquer reivindicações económicas) foi: em Janeiro de 1905 — 123 000, em Outubro — 328 000, em Dezembro — 372 000. E querem fazer-nos crer que esse crescimento foi «artificial»! Apresentam-nos uma fábula segundo a qual semelhante crescimento da luta política de massas a par das insurreições nas tropas é possível sem a passagem inevitável à insurreição armada! Não, isto não é história da revolução, mas calúnia liberal da revolução!
III
«Precisamente nesse momento», escreve Mártov acerca da greve de Outubro(16), «momento de despertar geral das massas operárias... surge a aspiração de fundir num todo a luta pela liberdade política e a luta económica. Mas, contrariamente à opinião da camarada Rosa Luxemburg, isso exprimia não um lado forte mas um lado fraco do movimento.» A tentativa de implantar por via revolucionária a jornada de trabalho de 8 horas fracassou e «desorganizou» os operários. «Foi nesse mesmo sentido que actuou a greve geral dos empregados dos correios e telégrafos em Novembro de 1905.» É assim que Mártov escreve a história.
Basta lançar um olhar à estatística atrás apresentada para ver a falsidade dessa história. Ao longo de todos os três anos da revolução vemos em cada agravamento da crise política o ascenso da luta grevista não apenas política mas também económica. A sua unificação não constituía a fraqueza mas a força do movimento. A opinião inversa é a opinião dos burgueses liberais, que desejariam precisamente a participação dos operários na política sem que isso atraísse as mais amplas massas para a revolução e para a luta contra a burguesia. Foi precisamente depois de 17 de Outubro que o movimento liberal dos zemstvos(17) se cindiu definitivamente: os proprietários agrários e os industriais criaram o partido abertamente contra-revolucionário dos «outubristas»(18), que se lançaram com toda a força da repressão contra os grevistas (enquanto os liberais de «esquerda», os democratas-constitucionalistas(19), acusavam na imprensa os operários de «insensatez»). Mártov, na esteira dos outubristas e dos democratas-constitucionalistas, vê uma «fraqueza» dos operários no facto de nesse preciso momento terem tentado tornar a luta económica ainda mais ofensiva. Nós vemos uma fraqueza dos operários (e mais ainda dos camponeses) no facto de terem passado com insuficiente decisão, com insuficiente amplitude, com insuficiente rapidez à luta económica ofensiva e à luta política armada, que decorria inevitavelmente de todo o curso de desenvolvimento dos acontecimentos e de modo nenhum dos desejos subjectivos de determinados grupos ou partidos. Há um abismo entre a nossa opinião e a opinião de Mártov, e esse abismo entre as opiniões de «intelectuais» reflecte apenas, mau grado Trótski, o abismo que existia na prática em fins de 1905 entre classes, concretamente entre o proletariado revolucionário combatente e a burguesia que se comportava como traidora.
É preciso acrescentar ainda que as derrotas dos operários na luta grevista não caracterizam apenas o fim de 1905, isolado do contexto por Mártov, mas mais ainda os anos de 1906 e 1907. A estatística diz-nos que em 10 anos, 1895-1904, os industriais venceram 51,6% das greves (quanto ao número de grevistas); em 1905, 29,4%; em 1906, 33,5%; em 1907, 57,6%; em 1908, 68,8%. Quererá isso dizer que as greves económicas de 1906-1907 foram «insensatas», «inoportunas», foram «um lado fraco do movimento»? Não. Isto quer dizer que na medida em que a arremetida da luta, revolucionária das massas foi insuficientemente forte em 1905, a derrota (tanto na política como na «economia») era inevitável; mas se o proletariado não tivesse nesse momento sido capaz de se erguer pelo menos duas vezes para uma nova arremetida contra o inimigo (um quarto de milhão só de grevistas políticos no segundo trimestre de 1906 e também em 1907), a derrota teria sido ainda mais forte; o golpe de Estado não teria ocorrido em Junho de 1907(20), mas um ano, ou mesmo mais que um ano, antes; as conquistas económicas de 1905 teriam sido retiradas aos operários ainda mais depressa.
E Mártov não compreende de modo nenhum este significado da luta revolucionária das massas. Na esteira dos liberais, ele diz a propósito do boicote no início de 1906 que a «social-democracia ficou temporariamente fora da linha política da luta». De um ponto de vista puramente teórico, semelhante modo de colocar a questão do boicote de 1906 é uma incrível simplificação e vulgarização de um problema muito complexo. Qual era a real «Linha de luta» no 2.° trimestre de 1906, parlamentar, ou extraparlamentar? Vejamos a estatística: o número de grevistas «económicos» sobe de 73 000 para 222 000, o dos políticos de 196 000 para 257 000. A percentagem dos uézds abrangidos pelo movimento camponês aumenta de 36,9% para 49,2%. É sabido que as insurreições militares também se reforçaram extraordinariamente e se tornaram mais frequentes no 2.° trimestre de 1906 em comparação com o 1.° trimestre. É ainda sabido que a I Duma era o parlamento mais revolucionário do mundo (no princípio do século XX) e ao mesmo tempo o mais impotente; nenhuma das suas decisões foi levada à prática.
Tais são os factos objectivos. Os liberais e Mártov avaliam estes factos no sentido de que a Duma era uma «linha de luta» real, enquanto as insurreições, as greves políticas, as agitações dos camponeses e dos soldados eram uma quimera de «românticos revolucionários». E o profundo pensador Trótski pensa que as dissensões das fracções em relação a este ponto eram «uma luta de intelectuais pela influência sobre o proletariado imaturo». Nós pensamos que os dados objectivos testemunham a existência, na Primavera de 1906, de um ascenso tão sério da luta verdadeiramente revolucionária das massas que o partido social-democrata foi forçado a reconhecer precisamente essa luta como luta principal e a empenhar todos os seus esforços para a apoiar e desenvolver. Pensamos que a situação política peculiar dessa época — quando o governo tsarista recebeu da Europa um empréstimo de dois mil milhões, de certo modo sob a condição de que a convocação da Duma fosse assegurada, quando o governo tsarista promulgava apressadamente leis contra o boicote da Duma — justificou inteiramente a tentativa do proletariado de retirar das mãos do tsar a convocação do primeiro parlamento na Rússia. Pensamos que não foram os sociais-democratas, mas os liberais que «ficaram então fora da linha política de luta». As ilusões constitucionalistas, em cuja propagação entre as massas assentava toda a carreira dos liberais na revolução, foram refutadas da maneira mais evidente pela história da primeira Duma.
Nas duas primeiras Dumas os liberais (democratas-constitucionalistas) tiveram a maioria e ocuparam ruidosamente o proscénio político. Mas foram precisamente essas «vitórias» dos liberais que mostraram com evidência que os liberais estiveram constantemente «fora da linha política de luta», que eles eram comediantes políticos que corrompiam profundamente a consciência democrática das massas. E se Mártov e os seus amigos, na esteira dos liberais, apontam as pesadas derrotas da revolução como uma lição «daquilo que se não deve fazer», nós responder-lhes-emos: a única vitória real alcançada pela revolução foi a vitória do proletariado, que rejeitou os conselhos liberais para participar na Duma de Bulíguine e levou atrás de si as massas camponesas para a insurreição. Isto em primeiro lugar. E em segundo lugar, com a sua luta heróica ao longo de três anos (1905-1907) o proletariado russo conquistou para si e para o povo russo aquilo que outros povos levaram dezenas de anos a conquistar. Conquistou a libertação das massas operárias da influência do liberalismo traidor e desprezivelmente impotente. Conquistou para si o papel hegemónico na luta pela liberdade, pela democracia, como condição para a luta pelo socialismo. Conquistou para todas as classes oprimidas e exploradas da Rússia a capacidade de conduzir a luta revolucionária de massas, sem a qual em parte nenhuma do mundo se alcançou nada de sério no progresso da humanidade.
Essas conquistas não as arrancarão ao proletariado russo nenhuma reacção, nenhum ódio, invectivas e cólera dos liberais, nenhumas vacilações, miopia e cepticismo dos oportunistas socialistas.
IV
O desenvolvimento das fracções da social-democracia russa depois da revolução explica-se uma vez mais não pela «adaptação da intelectualidade ao proletariado» mas pelas modificações nas relações entre as classes. A revolução de 1905-1907 agudizou, tornou aberto e colocou na ordem do dia o antagonismo entre o campesinato e a burguesia liberal quanto à questão da forma do regime burguês na Rússia. Um proletariado politicamente amadurecido não poderia deixar de participar do modo mais enérgico nessa luta, e a luta entre o bolchevismo e o menchevismo constituiu um reflexo da sua atitude para com as diversas classes da nova sociedade.
Os três anos de 1908 a 1910 caracterizam-se pela vitória da contra-revolução, pelo restabelecimento da autocracia e pela III Duma, a Duma das centúrias negras(21) e dos outubristas. A luta entre as classes burguesas em torno da forma do novo sistema saiu do proscénio. Para o proletariado colocou-se na ordem do dia a tarefa elementar de defender o seu partido, proletário, hostil tanto à reacção como ao liberalismo contra-revolucionário. Esta tarefa não é fácil, porque foi precisamente sobre o proletariado que recaiu todo o peso das perseguições económicas e políticas, todo o ódio dos liberais pelo facto de a social-democracia lhes haver arrancado a direcção das massas na revolução.
A crise do partido social-democrata é muito grave. As organizações foram desmanteladas. Muitos dos antigos dirigentes (principalmente entre os intelectuais) foram presos. Surgiu já um novo tipo de operário social-democrata, que toma os assuntos do partido nas mãos, mas ele tem extraordinárias dificuldades a vencer. Em tais condições, o partido social-democrata perde muitos «companheiros de jornada». É natural que na revolução burguesa se tenham juntado aos socialistas companheiros de jornada pequeno-burgueses. Presentemente eles afastam-se do marxismo e da social-democracia. Este processo manifestou-se em ambas as fracções: entre os bolcheviques sob a forma da corrente «otzovista»(22), que surgiu na Primavera de 1908, foi imediatamente derrotada na conferência de Moscovo e, depois de uma longa luta, foi repudiada pelo centro oficial da fracção, constituiu no estrangeiro uma fracção à parte — a fracção «vperiodista»(4*). A peculiaridade do período de desagregação exprimiu-se em que nesta fracção se juntaram os «machistas»(23) que na sua plataforma inscreveram a luta contra o marxismo (a pretexto da defesa da «filosofia proletária») e os «ultimatistas»(24), esses otzovistas envergonhados, e diversos tipos de «sociais-democratas dos dias de liberdade», entusiasmados pelo «brilho» das palavras de ordem, que as aprenderam de cor mas que não compreenderam as bases do marxismo.
Entre os mencheviques, esse mesmo processo de afastamento dos «companheiros de jornada» pequeno-burgueses manifestou-se na corrente liquidacionista, que ganhou agora inteiramente forma na revista de Potréssov Nacha Zariá, na Vozrojdénie e na Jizn(25), nas posições dos «16»(26) e do «trio» (Mikhaíl, Roman, luri)(27), tendo ainda o jornal do estrangeiro Gólos Sotsial-Demokrata ocupado na prática o lugar de servidor dos liquidacionistas russos e de sua cobertura diplomática junto das pessoas do partido.
Não tendo compreendido o significado histórico e económico dessa desagregação na época da contra-revolução, desse afastamento do partido operário social-democrata dos elementos não sociais-democratas, Trótski fala aos leitores alemães de «desagregação» de ambas as fracções, da «desagregação do partido», da «decomposição do partido».
Isso é mentira. E essa mentira exprime, em primeiro lugar, a completa incompreensão teórica de Trótski. Trótski de modo nenhum compreendeu por que é que o plenário reconheceu que tanto o liquidacionismo como o otzovismo são «uma manifestação da influência burguesa sobre o proletariado». Com efeito, reflictamos um pouco: é a desagregação do partido, a decomposição do partido, ou o seu reforço e depuração que se exprime na separação das correntes condenadas pelo partido, que reflectem a influência burguesa sobre o proletariado?
Em segundo lugar, esta mentira exprime na prática a «política» publicitária da fracção de Trótski. Que o empreendimento de Trótski é uma tentativa de formar uma fracção, é o que todos e cada um agora vêem, quando Trótski afastou do Pravda o representante do CC(28). Ao fazer publicidade da sua fracção, Trótski não hesita em contar aos alemães que o «partido» se desagrega, que ambas as fracções se desagregam, mas que ele, Trótski, salva tudo sozinho. De facto todos vemos agora — e a mais recente resolução dos trotskistas (em nome do clube de Viena, em 26 de Novembro de 1910) mostra-o com particular evidência — que Trótski goza de confiança exclusivamente junto dos liquidacionistas e dos «vperiodistas».
Até onde vai o descaramento de Trótski, rebaixando o partido e enaltecendo-se a si mesmo perante os alemães, mostra-o, por exemplo, o exemplo seguinte. Trótski escreve que as «massas operárias» na Rússia consideram que «o partido social-democrata se situa fora [sublinhado de Trótski] do seu círculo», e fala de «sociais-democratas sem social-democracia».
Como é que o senhor Potréssov e os seus amigos não haviam de beijar Trótski por tais palavras?
Mas essas palavras são refutadas não apenas por toda a história da revolução, mas até pelas eleições para a III Duma na cúria operária(29).
Quanto ao trabalho nas organizações legais, escreve Trótski,
«as fracções dos mencheviques e dos bolcheviques mostraram-se, pela sua estrutura ideológica e organizativa anterior, totalmente incapazes»; funcionaram «determinados grupos de sociais-democratas, mas tudo isso decorreu fora do quadro das fracções, fora da sua influência organizativa». «Mesmo a mais importante organização legal, na qual os mencheviques detêm a maioria, funciona inteiramente fora do controlo da fracção menchevique.»
Assim escreve Trótski. Mas vejamos quais são os factos. Desde o próprio início da existência da fracção social-democrata na III Duma, a fracção bolchevique, através de pessoas da sua confiança, com plenos poderes do CC(5*) do partido, realizou constantemente um trabalho de colaboração, ajuda, conselho e controlo do trabalho dos sociais-democratas na Duma. O mesmo faz a redacção do OC(6*) do partido, constituída por representantes das fracções (que se dissolveram, como fracções, em Janeiro de 1910).
Quando Trótski conta pormenorizadamente aos camaradas alemães a idiotice do «otzovismo», apresentando esta corrente como uma «cristalização» do boicotismo que é próprio de todo o bolchevismo, e depois quando recorda em duas palavras que o bolchevismo «não se deixou dominar» pelo otzovismo mas «actuou contra ele duma maneira resoluta ou, mais exactamente, desenfreada», o leitor alemão certamente não imaginará quanta requintada perfídia existe em semelhante exposição. A «reserva» jesuítica de Trótski consiste em omitir uma pequena, muito pequena «bagatela». Ele «esqueceu-se» de contar que já na Primavera de 1909 a fracção bolchevique, numa reunião oficial dos seus representantes, afastara de si, expulsara os otzovistas. Mas é precisamente esta «bagatela» que é incómoda para Trótski, desejoso de falar da «desagregação» da fracção bolchevique (e em seguida do partido) e não do afastamento dos elementos não sociais-democratas!
Nós consideramos presentemente Mártov como um dos chefes do liquidacionismo, tanto mais perigoso quanto mais «habilmente» defende os liquidacionistas com palavras pseudomarxistas. Mas Mártov expõe abertamente concepções que deixaram a sua marca em correntes inteiras do movimento operário de massas de 1903 a 1910. Trótski, pelo contrário, apresenta apenas as suas vacilações pessoais e nada mais. Ele era menchevique em 1903; afastou-se do menchevismo em 1904, voltou ao menchevismo em 1905, ostentando apenas frases ultra-revolucionárias; em 1906 afastou-se de novo; em fins de 1906 defendeu o acordo eleitoral com os democratas-constitucionalistas (isto é, de facto esteve de novo com os mencheviques), e na Primavera de 1907, no congresso de Londres(30) disse que a sua diferença em relação a Rosa Luxemburg era «mais uma diferença de matizes individuais do que de orientações políticas». Trótski plagia hoje a bagagem ideológica de uma fracção, amanhã a de outra, e por isso declara-se acima de ambas as fracções. Em teoria, Trótski não está de acordo em nada com os liquidacionistas e otzovistas mas na prática está de acordo em tudo com os golossistas e vperiodistas.
Por isso, se Trótski diz aos camaradas alemães que representa a «tendência geral do partido», então eu devo declarar que Trótski representa apenas a sua fracção e que goza de alguma confiança exclusivamente junto dos otzovistas e liquidacionistas. Eis factos que provam a justeza da minha declaração. Em Janeiro de 1910 o Comité Central do nosso partido estabeleceu estreito contacto com o jornal de Trótski, Pravda, nomeando para a sua redacção um representante do CC. Em Setembro de 1910 o Órgão Central do partido noticiou o rompimento do representante do CC com Trótski em consequência da política antipartido de Trótski. Em Copenhaga, Plekhánov, como representante dos mencheviques partidistas e delegado da redacção do OC, em conjunto com o autor destas linhas como representante dos bolcheviques e um camarada polaco(7*), protestaram vivamente contra a maneira como Trótski apresentava os assuntos do nosso partido na imprensa alemã.
Que os leitores julguem agora se Trótski representa a tendência «geral do partido» ou a «tendência geral antipartido» na social-democracia russa.
Fonte: marxists.org
Notas de fim de tomo:
(1) Die Neue Zeit (Tempos Novos): revista teórica do Partido Social-Democrata Alemão; publicou-se em Estugarda de 1883 a 1923. Algumas obras de K. Marx e F. Engels foram publicadas pela primeira vez na Die Neue Zeit. Colaboravam na revista destacadas personalidades do movimento operário alemão e internacional: A. Bebel, W. Liebknecht, Rosa Luxembourg, F. Mehring, Clara Zetkin, P. Lafargue, G. Plekhánov e outros. Engels ajudava constantemente a redacção da revista com os seus conselhos e frequentemente criticava-a pelos desvios do marxismo cometidos na revista. Na segunda metade dos anos 90 começaram a publicar-se sistematicamente na revista artigos dos revisionistas. (retornar ao texto)
(2) Menchevismo: principal corrente oportunista pequeno-burguesa na social-democracia russa, uma das variedades do oportunismo internacional. Constitui-se em 1903 no II Congresso do POSDR. Durante as eleições, no congresso, para os órgãos do partido, os partidários de Lénine, que obtiveram a maioria – em russo bolchinstvó – dos votos foram chamados de bolcheviques, e aqueles que se lhes opunham foram chamados de mencheviques (de minoria, menchinstvó em russo). Os mencheviques pronunciaram-se contra o programa revolucionário do partido e contra a hegemonia do proletariado na revolução, contra a aliança da classe operária com o campesinato e a favor do acordo com a burguesia liberal. (retornar ao texto)
(3) Blanquismo: corrente política ligada ao nome do destacado revolucionário francês Louis Auguste Blanqui, representante do comunismo utópico. Os blanquistas negavam a luta de classes, considerando que mesmo sem a existência de uma situação revolucionária um reduzido grupo de conspiradores desligados da classe revolucionária, podia realizar uma revolução vitoriosa. (retornar ao texto)
(4) Lénine cita o artigo de K. Marx «Projecto de lei sobre a supressão das corveias feudais», publicado pela primeira vez na Neue Reinische Zeitung. A Neue Reinische Zeitung (Nova Gazeta Renana) publicou-se diariamente em Colónia de 1 de Junho de 1848 at+e 19 de Maio de 1949. Os editoriais, que definiam a posição do jornal sobre as mais importantes questões da revolução alemã e europeia, eram escritos fundamentalmente por K. Marx e F. Engels. (retornar ao texto)
(5) Lénine refere-se ao discurso de A. Bebel no Congresso de Madgdeburgo de Partido Social-Democrata Alemão, realizado em Setembro de 1910. (retornar ao texto)
(6) Por «marxismo» brentaniano e sombartiano Lénine designa diferentes variedades de deturpação burguesa do marxismo. O economista burguês alemão Lujo Brentano advogava a possibilidade de solução da questão operária no quadro do capitalismo através da legislação fabril e da organização dos operários nos sindicatos. Outro economista alemão, Werner Sombart, actuava como apologista declarado do capitalismo. Deturpando a teoria marxista, retirava-lhe a essência revolucionária, dissimulava a exploração capitalista, negava a inevitabilidade das crises económicas no capitalismo, apresentava o capitalismo como um sistema económico harmonioso e a sociedade burguesa como «harmonia das classes». (retornar ao texto)
(7) Lénine refere-se à «Resolução táctica sobre a questão agrária» aprovada no IV Congresso de Unificação do POSDR, realizado em Abril de 1906. (retornar ao texto)
(8) Trata-se de um artigo de K. Marx da série de artigos «A crise e a contra-revolução». Ao falar das «zombarias de Mehring», Lénine tem em vista a introdução de Mehring ao terceiro tomo do espólio literário de K. Marx, F. Engels e F. Lassalle, por ele editado. (retornar ao texto)
(9) Duma do Estado: órgão representativo que o governo tsarista se viu forçado a convocar em consequência dos acontecimentos revolucionários de 1905. Formalmente, a Duma do Estado era um órgão legislativo mas na prática não tinha qualquer poder efectivo.As eleições para a Duma do Estado não eram directas nem iguais nem gerais. Os direitos eleitorais das classes trabalhadoras, bem como das nacionalidades não russas que habitavam na Rússia, eram fortemente reduzidos, e uma parte significativa dos operários e camponeses não tinha quaisquer direitos eleitorais. A I (Abril-Julho de 1906) e a II (Fevereiro-Junho de 1907) Dumas de Estado foram dissolvidas pelo governo. Depois do golpe de Estado de 3 de Junho de 1907, o governo publicou uma nova lei eleitoral, ainda mais limitativa dos direitos dos operários e camponeses e da pequena burguesia urbana e que garantia o completo domínio do bloco reaccionário dos latifundiários e grandes capitalistas na III (1907-1912) e na IV (1912-1917) Dumas de Estado. (retornar ao texto)
(10) Trata-se da ala direita do menchevismo, formada em meados de 1908, cujos partidários se pronunciavam pela liquidação do partido revolucionário ilegal e pela criação de um partido legal reformista e recusavam o programa revolucionário do POSDR. O jornal Gólos Sotsial-Demokrata (A Voz da Social-Democracia) — órgão dos mencheviques no estrangeiro – que se publicou de 1908 a 1911, inicialmente em Genebra e depois em Paris, assumiu a defesa dos liquidacionistas. Em 1912 os mencheviques liquidacionistas foram expulsos do POSDR. Nacha Zariá: revista legal mensal dos mencheviques liquidacionistas, que se publicou em Petersburgo de 1910 a 1914. Em torno da Nacha Zariá formou-se o centro dos mencheviques liquidacionistas da Rússia. (retornar ao texto)
(11) Anarquismo: corrente social pequeno-burguesa, defende a destruição imediata de todo o poder. Anarco-sindicalismo: corrente oportunista no movimento operário, surgida com base no anarquismo. Rejeitando a luta política, o papel dirigente dos partidos políticos operários, considera os sindicatos como a forma superior de organização da classe operária e a greve geral económica como a forma superior de luta. (retornar ao texto)
(12) Em 6 (19) de Agosto de 1905 foi publicado um manifesto-lei do tsar sobre a instituição da Duma de Estado. A Duma recebeu a designação de Duma de Bulíguine devido ao nome do ministro do Interior A. Buliguine, que o tsar encarregou de redigir o projecto da Duma. Segundo esse projecto, a Duma não tinha o direito de adoptar quaisquer leis, podendo apenas discutir algumas questões
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