Carlos Marighella
1966
Apresentação:
Hoje trazemos mais um artigo de Marighella, porém, tendo em vista a necessidade extrema de nós, comunistas, conhecermos nossa própria realidade e nossa história, é necessário compreendermos como nossos próprios camaradas a leram.
Nesse artigo, escrito pouco tempo depois do golpe empresarial-militar, Marighella tenta tomar conta da conjuntura política brasileira e das condições materiais que levaram a derrocada do golpe. Apontando para as condições do movimento da década de 60, Marighella aponta a necessidade da guerrilhao como forma de uma mobilização das massas, que apontaria o caráter ilegítimo da ditadura e estimularia a mobilização urbana e no campo.
É necessários que conheçamos nossa própria história, tanto a de nosso país, quanto a do movimento comunista. Devemos compreender não apenas a teoria como ela se dá hoje, mas a forma com que ela se desenvolve e seu processo de luta que desagua na base de sua análise de conjuntura e da tática revolucionária atual. Há ressalvas que devem ser feitas perante tal artigo, sendo as duas maiores a noção do conceito “etapista da revolução”, como o de “semi-feudalidade”. Sobre esse primeiro conceito, já é claro que ele se encontra defasado e que uma revolução não precisa passar por uma revolução burguesa primeiro, para somente depois, alcançar uma revolução socialista. Sobre o segundo, que até hoje é reivindicado por certas vertentes, é defasado, errôneo e uma visão revisionista histórica, pois é claro que o Brasil, enquanto um país agroindustrial, com seu capital plenamente desenvolvido em todas relações, se coloca como uma nação que teve seu desenvolvimento pautado na dependência do império para o seu funcionamento. Vemos isso se concretizando nas mais variadas formas, sendo uma delas a existência dos "boias frias", trabalhadores assalariados do campo, sem vínculos empregatícios, muitas vezes contratados por grandes latifúndios e empresas estrangeiras.
Ademais, é de grande valia compreendermos como nossos camaradas viram, compreenderam e planejaram a luta nos diferentes momentos de nossa história.
- Nota Editorial por Camarada Gustavo R.
As Causas da Derrota e as Perspectivas da Situação
O golpe de primeiro de abril sobreveio, e tornou-se vitorioso, sem que as forças antigolpistas, e entre elas os comunistas, pudessem esboçar qualquer resistência. A única resistência de massas organizada contra o golpe foi a greve geral, mesmo assim sem condições de prosseguir, em virtude do despreparo geral.
Vale a pena recordar que, com a renúncia de Jânio, em 1961, fomos tomados de perplexidade e reconhecemos que não estávamos preparados para enfrentar os acontecimentos. Advertimo-nos, então, de que sobreviriam novas crises de governo e de que, nesse caso, deveríamos agir diferentemente, tudo fazendo para que, até lá, já tivéssemos superado nosso despreparo.
Não foi o que se deu em face da deposição do governo de Jango, no momento do golpe de abril. Quer dizer, continuamos despreparados. O processo democrático em desenvolvimento foi paralisado, e entramos numa fase de recuo.
A falta de resistência ao golpe prendeu-se, assim, ao nosso despreparo. Despreparo político e sobretudo ideológico. Despreparo dos comunistas como de toda a área antigolpista. O que se tornou evidente em face da abrilada e nos dias imediatos, desde quando deixou de existir qualquer resposta ou diretiva para a ação, proveniente das lideranças, sem qualquer exceção.
Quanto aos comunistas, a resistência tornou-se impossível porque nossa política — no essencial — vinha sendo feita sob a dependência da política do governo. Quer dizer, sob a dependência da liderança da burguesia, ou melhor, do setor da burguesia que ocupava o poder. Tal posição contribuiu para quebrar a autoridade e anular nossa força, uma e outra necessárias quando se trata de influir na frente única, levá-la à consolidação, paralisar as áreas vacilantes e exercer um nítido papel ideológico diante dos setores mais radicais da pequena burguesia.
Quando a liderança do proletariado se subordina à liderança da burguesia ou com ela se identifica, a aplicação da linha revolucionária sofre inevitavelmente desvios para a esquerda e a direita. Pois, nesse caso, falta o lastro ideológico, único recurso capaz de impedir o desvio dos rumos da revolução.
A subestimação do perigo de direita no panorama político brasileiro foi fruto do reboquismo e da ilusão no governo. Acreditava-se que a burguesia seguiria o caminho das reformas pacíficas sob a pressão do movimento de massa, e que a direita não se levantaria. E que, se isto acontecesse, a burguesia tomaria a iniciativa da resistência e do combate aos golpistas.
Foram inúmeras as vezes em que repetimos que o desencadeamento de um golpe de direita seria a guerra civil no país ou que à violência dos golpistas responderíamos com a violência das massas. Como as palavras não coincidiram com os fatos, isto significa que não nos preparamos. Estávamos confiantes em que o governo resistiria. Nem ao menos denunciamos insistentemente o golpe de direita. Deixamos de chamar as massas à vigilância e não as alertamos para a eventualidade de uma resistência.
A falta de vigilância e a ilusão de classe subsistem exatamente quando a liderança deixa de lado o estabelecimento de um plano tático marxista e não leva em conta a obrigatoriedade do princípio da retirada. O marxismo-leninismo é inteiramente avesso à concepção de que na luta de massas tudo se resume em avançar. Assim, ao acionar a linha política de apoio às reformas propugnadas pelo setor da burguesia no poder, não era suficiente assinalar os êxitos obtidos pelas massas. Tornava-se preciso, simultaneamente, alertá-las e organizá-las para a possibilidade de recuo da burguesia, uma capitulação ante a direita ou o desencadeamento do golpe militar — sempre na ordem do dia, quando o movimento de massas cresce a ponto de ameaçar o poder ou a ponto de levar a democracia a uma mudança de qualidade.
O erro que se manifestou foi, portanto, um erro ideológico, que pode ser traduzido como a perda do sentido de classe da luta revolucionária do povo brasileiro. Tal erro, projetado em dimensão histórica em nossa atividade, reflete-se em diferentes e por vezes contraditórias manifestações políticas e táticas dos comunistas ao longo da vida política brasileira.
É impossível fugir à caracterização de um erro ideológico evidente e tradicional na liderança comunista brasileira.
A falta de condições ideológicas na liderança marxista levou a que uma linha política com probabilidade de êxito viesse a terminar em derrota.
Com o mesmo sentido de falta de substância ideológica surgiu a falsa tese da "nova tática do imperialismo". Segundo essa tese, o imperialismo norte-americano não estaria interessado em golpes e ditadura. O golpe de primeiro de abril, inspirado e promovido pelos Estados Unidos com apoio em seus agentes internos e no fascismo militar brasileiro, invalidou essa teoria, cujo principal resultado foi deixar-nos desprevenidos e perplexos ante o golpe da direita.
Uma apreciação errônea do papel das forças armadas nos levou a ilusões no dispositivo militar do governo, dispositivo com base ideológica nacionalista, e que, por isso mesmo, não estando sob a influência ideológica do proletariado, jamais se mobilizaria para decidir a favor das massas qualquer situação capaz de levá-las a ameaçar privilégios das classes dominantes.
Os repetidos apelos à greve geral política — sem o apoio do campesinato e sem o recurso à insurreição — significavam um erro tático em face do marxismo contemporâneo. O erro era mais evidente na medida em que nosso trabalho no seio do proletariado se desenvolvia com uma nítida característica de trabalho de cúpula e se circunscrevia, na prática, às empresas estatais.
Uma falha básica era a debilidade do movimento camponês. A falta de decisão em dar prioridade ao trabalho no campo é responsável por essa falha básica, já tornada crônica. Sem mobilização do campo é impossível o avanço da revolução.
Também não foi entendido pela liderança marxista o caráter objetivo do processo de radicalização de alguns setores da pequena burguesia, o que — ao lado de outros erros — contribuiu para que não exercêssemos qualquer papel de influência decisiva entre marinheiros, sargentos e outras forças radicais, impossibilitando, assim, a unidade de ação dentro da frente única, da qual também éramos parte.
Falsos métodos de direção, a subestimação da direção coletiva, a falta de unidade ideológica da liderança são outros fatores que conduziram à derrota que sofremos.
Agora estamos em face de uma nova situação. Em vez de um governo da burguesia, lutando pelas reformas à sua maneira, dentro de um clima de liberdades, temos uma ditadura entreguista militar, dentro de um clima onde as liberdades democráticas foram suprimidas.
Nossa tática não pode ser a mesma da situação anterior, quando o movimento de massas estava em ascenso. Agora, a marcha da democracia foi interrompida, entramos numa fase de recuo. Ainda que os problemas brasileiros continuem sendo de reformas de estrutura, só poderemos resolvê-los derrotando a ditadura e assegurando a restauração das liberdades democráticas. Nosso objetivo tático fundamental — para chegarmos a reformas de estrutura e prosseguirmos com a luta até uma vitória posterior do socialismo — está em substituir o atual governo por outro que assegure as liberdades e faça uma abertura para o progresso.
O governo pelo qual lutamos agora não poderá ser senão o resultante da frente única antiditadura, que é o tipo de frente única possível nos dias atuais. Esforçando-nos para que tal frente única se torne realidade, sustentamos — como antes — a necessidade de nossa aliança com a burguesia nacional, levando em conta não somente tudo o que dela nos aproxima, quando se trata de objetivos comuns na defesa de interesses nacionais, mas também tudo o que dela nos separa em questões de classe, tática, métodos, ideologia, programas.
A forma de luta principal no atual período é a luta de resistência de massas com suas mil e uma particularidades. E o partido deve ser o chefe da oposição popular, para não ficarmos a reboque da oposição burguesa, que, como tudo indica, procurará ir adiante, tentando arrastar-nos na sua retaguarda. Não podemos abandonar a luta pela liderança da oposição popular, o que seria uma renúncia imperdoável em face da disputa da hegemonia na condução dos destinos do povo brasileiro. Devemos, por isso, ser firmes lutadores da resistência, incansáveis no combate à ditadura.
Muitos outros elementos táticos têm que ser mudados na nova situação. O movimento de massas — por cuja mudança de qualidade devemos continuar lutando — já não pode visar, nas condições atuais, a pressão sobre o governo, como se tivesse por finalidade modificar a política e a composição da ditadura. O objetivo do movimento de massas é levar a ditadura à derrota, substituí-la por outro governo.
Outro caráter também têm as eleições. Seus objetivos não são para nós os mesmos das eleições no período anterior ao golpe. Não não se trata de eleger nacionalistas como antes, quando vigoravam as liberdades democráticas, e por este meio chegar à mudança da correlação de forças.
Trata-se de desenvolver esforços para aglutinar as forças que se opõem à ditadura e contribuir para levá-la à derrota, reduzindo-lhe a base política e social. Se nada disto é possível através das eleições — tal como a ditadura as convoca — nosso dever é denunciá-lo à massa, ainda que não nos recusemos à utilização das mínimas possibilidades legais.
O partido deve deixar de ser uma espécie de apêndice dos partidos da burguesia, para ser capaz de arrastar o proletariado e as massas populares. Nosso aparecimento ao lado de candidatos comprometidos com o golpe e a ditadura nos desmoraliza junto às massas, e ajuda a justificar a farsa eleitoral. O que não podemos é ajudar a institucionalização da ditadura, capitulando ante as violências e ameaças dos golpistas ou deixando-nos iludir com as suas manobras.
Para a ditadura as eleições representam um meio de institucionalizar o golpe. Suprimidas as eleições diretas e cerceado o direito do povo de eleger seus representantes, estabelecidas as inelegibilidades, dissolvidos os partidos políticos, além de tantas outras medidas coercitivas, as eleições tornaram-se uma farsa.
A posse dos eleitos é uma concessão do governo ditatorial. Aos que obtiveram ou vierem a obter a vitória eleitoral em oposição à ditadura, não lhes será permitido mais do que a tutela de um super-governo militar, de livre escolha do Executivo e seu Ministro da Guerra. Abolida por mais este meio a autonomia dos Estados e Municípios, a nomeação de secretários de governo e outras autoridades não é mais função dos eleitos e sim, atribuição do SNI e do Conselho de Segurança Nacional, órgãos através dos quais opera o poder militar.
Estribado em poderes como jamais teve qualquer Presidente no Brasil, ao estilo desse L'Etat c'est moi com que Luís XIV, de França, firmou o princípio da monarquia absoluta, o atual Presidente da República, através da eleição indireta, procurará garantir para seu sucessor um militar.
Não obstante a implacável ação da ditadura, esmagando pela força e progressivamente as válvulas de escape dos meios legais de resistência, o ano de 1966 prenuncia-se carregado de tensões políticas, mercê da luta pela sucessão presidencial.
Nada indica o fim da instabilidade política, reflexo da crise crônica de estrutura. A instabilidade política continua caracterizando a situação do país. A tendência é para o agravamento das contradições de classe.
O Ato Institucional número 2, e os demais atos complementares, indicam que a ditadura não pode deter-se no despenhadeiro. Crises de governo, a eclosão de novos golpes, a decretação do sítio, conflitos de fronteiras e outros tantos acontecimentos, que reflitam a inquietação política, naturalmente espreitam o povo brasileiro.
Tais resultados podem ocorrer em consequência da desastrosa política econômico-financeira do governo, das concordatas, do desemprego, da carestia, da submissão ao Fundo Monetário Internacional, da política antioperária, da política de entrega e submissão aos Estados Unidos e, paralelamente, do crescimento das lutas de massas.
Outro fator previsível de agravamento da crise brasileira é a agressividade do imperialismo ianque, que vai aumentando sem cessar. O exemplo mais recente consistiu na resolução da Câmara de Representantes dos Estados Unidos, determinando a invasão militar norte-americana em qualquer país que o chamado colosso do Norte considere ameaçado pelo comunismo. Aqui a palavra comunismo é apenas substitutivo do movimento de libertação nacional dos povos.
Não bastasse tal exemplo, e seria suficiente acrescentar a invasão de São Domingos e a guerra do Vietnã. Na intervenção militar em São Domingos já participam tropas brasileiras, que, lado a lado com os odiados "marines" norte-americanos, ajudam a massacrar o bravo povo dominicano em luta por sua liberdade.
A antipatia com que os povos latino-americanos vêem o Brasil, em conseqüência de sua vassalagem ante a ação agressiva dos imperialistas estadunidenses, não deixará de produzir seus efeitos entre nosso povo, e levará ao incremento da oposição popular à ditadura brasileira.
Não é impossível que, em face de uma situação desvantajosa para a atual ditadura no Brasil ou no caso de ser ameaçada de derrubada pelas massas, os Estados Unidos venham em socorro do governo ditatorial — que lhes serve de ponto-de-apoio — e em favor das classes dominantes brasileiras, iniciando represálias contra o povo e a nação, e até mesmo ocupando partes de nosso território, tal como o Nordeste. Com o que não farão outra coisa senão prosseguir na agressão econômica, política e militar já em curso em nosso país.
Seria imperdoável que as forças populares e nacionalistas voltassem novamente a ser apanhadas de surpresa pelos acontecimentos vindouros. Para os revolucionários brasileiros não há outra perspectiva a não ser prepararem-se para a luta.
A Crise Brasileira e a Estratégia Revolucionária
A crise brasileira é uma crise de estrutura. E aqui nos referimos à estrutura econômica. O que quer dizer: a crise brasileira — em todos os sentidos, seja econômico, político ou social — é oriunda da inadaptabilidade da atual estrutura econômica do país. Da sua incapacidade em suportar a carga demasiado pesada a ela superposta.
Sendo — por definição — a estrutura econômica o conjunto das relações de produção, é nestas relações, no equacionamento de seus problemas atuais, que iremos encontrar as causas da crise brasileira.
As relações de produção no Brasil abrangem nosso sistema de propriedade. E não somente isso. Abrangem também as relações entre os homens ocupados no processo da produção, além das formas de distribuição das riquezas ou dos bens materiais.
São estas relações de produção que estão em crise — se assim podemos dizer. Pois já não se harmonizam às condições exigidas para o nosso progresso e desenvolvimento. E constituem um obstáculo ao avanço de nossas forças produtivas. O que se torna evidente pelo domínio do imperialismo norte-americano sobre a propriedade e a economia brasileira, pela predominância e o monopólio da propriedade territorial latifundiária, pelo desajuste na apropriação dos frutos do trabalho, pela desproporcional distribuição dos bens materiais, acentuando a acumulação das riquezas em mãos de uns poucos privilegiados, enquanto milhões de brasileiros vegetam, reduzidos à mais rasa miséria.
Nessas relações de produção configura-se, assim, um quadro onde verdadeiros pontos de corrosão ameaçam fazer ruir a estrutura econômica.
Oriunda da base econômica que a sustenta e à qual está intimamente ligada, a atual superestrutura da sociedade brasileira padece de muitos males. Os pontos de corrosão da base econômica não cessam de atuar sobre essa superestrutura, também em crise, e asperamente minada pelas contradições, antagonismos e conflitos que a sacodem.
É o que explica porque — ademais de outras — as instituições políticas brasileiras estão em crise permanente. E porque a instabilidade política é uma característica da situação política do Brasil.
Uma das particularidades da crise brasileira é seu caráter crônico. A crise brasileira faz parte da crise geral do capitalismo. A cada nova fase da crise geral do capitalismo corresponde um novo aspecto da crise econômica.
A sociedade brasileira passaria por muitas e importantes modificações, antes que se transformasse na sociedade atual.
Da escravidão evoluiria para outro tipo de relações, que levaria ao capitalismo, ao regime do salariado, ainda que conservada a dependência ao imperialismo norte-americano e mantido o monopólio da terra, com a sobrevivência e a reafirmação do latifúndio.
Historiador notável, além de crítico literário de renome, Nelson Werneck Sodré apreciou os fenômenos que condicionaram o desenvolvimento da sociedade brasileira. Fê-lo em vários trabalhos, e entre eles a "Formação Histórica do Brasil", a "História da Burguesia Brasileira", a "História Militar do Brasil", cuja leitura será sempre de grande utilidade.
A sociedade brasileira atual orienta-se num sentido sensivelmente burguês. Mas com suas particularidades e seu tipicismo brasileiro, resultado das condições que geraram seu desenvolvimento.
As grandes modificações que se deram em sua estrutura e que a levaram — na época contemporânea — ao seu estágio atual, originaram-se sobretudo da implantação da indústria siderúrgica, da indústria do petróleo e da indústria da energia elétrica. Ao contrário dos grandes países capitalistas de hoje, o Brasil chegou a um determinado nível de desenvolvimento capitalista quando o mundo já ingressara na época do imperialismo. Mais do que isso, na época em que o mundo está dividido entre dois grandes sistemas sociais mundiais — o do imperialismo e o do socialismo.
O Brasil não conseguiu, por isso, alcançar os países altamente desenvolvidos. Situa-se — como é notório — no ramo dos subdesenvolvidos. E — característica digna de menção — não pode seguir a trajetória clássica dos países que se elevaram ao capitalismo pelo caminho da revolução industrial.
O Brasil chegou ao limiar de sua expansão industrial típica, num momento em que a revolução industrial já estava realizada nos principais países do mundo e quando a época contemporânea já havia adquirida suas características essenciais. Este o fenômeno que explica por que a burguesia brasileira não teve forças nem recursos acumulados para implantar a indústria básica do Brasil, partindo da iniciativa privada. Para implantar a indústria básica, teve que deixá-la nas mãos do Estado, que instalou a siderurgia e tomou a si o encargo de explorar o petróleo e expandir a produção de energia elétrica. O monopólio estatal surgiria, assim, como uma categoria do capitalismo nacional, patenteada a fraqueza da burguesia brasileira para fazer da indústria de base um produto da empresa particular.
A originalidade do desenvolvimento brasileiro reside não somente na coincidência de cada novo surto da indústria no país com uma nova fase da crise geral do capitalismo. Há a acrescentar que, nessas condições, cada passo para a frente significa o aparecimento de novas e mais profundas contradições no processo brasileiro. O que não pode deixar de acarretar um novo agravamento da crise econômica.
Por sua vez, o avanço da técnica nos países altamente desenvolvidos influencia no sentido capitalista as forças produtivas dos países subdesenvolvidos. Certas conquistas da técnica moderna acabam, sempre, sendo transferidas ao Brasil. Tal fenômeno produz alterações em nossas forças produtivas, com reflexos no conjunto das relações de produção e até mesmo na superestrutura.
O Brasil é um país que, sem ter conseguido resolver contradições correspondentes à primeira fase da crise geral do capitalismo, vê-se obrigado a enfrentar novos e graves problemas, acumulados em mais duas outras fases da mesma crise geral.
Tudo isso nos dá um quadro impressionante da gravidade da crise crônica brasileira — originada do crescimento do capitalismo nas condições de dependência do imperialismo e manutenção do latifúndio.
Uma tal crise não poderia subsistir, sem que para ela fossem buscadas soluções pelas várias classes.
Estamos aqui em pleno domínio da política, entendidos como tal os meios, métodos e formas de que se utilizara as classes para galgar o poder ou dar solução aos seus problemas em função da atividade do Estado.
Dois grandes tipos de soluções políticas têm sido aventados no Brasil pelas classes. Um deles é o tipo de soluções concernentes à burguesia. O outro corresponde ao proletariado.
Todas as soluções intentadas pela burguesia levam o selo de uma classe que se distingue do proletariado por ser uma classe empresarial, detentora de meios de produção que lhe permitem uma imensa acumulação capitalista.
A burguesia brasileira distingue-se também do proletariado por manter laços muito estreitos com o latifúndio e ligações com o imperialismo, a despeito dos conflitos com este último e do fato de o latifúndio limitar-lhe o mercado interno.
Daí porque tais soluções vão desde o emprego da força e a supressão das liberdades até a tentativa de reformas de maior ou menor amplitude. O período do governo João Goulart foi aquele em que um setor da burguesia tentou ir mais longe na luta pelas reformas. Seu inevitável fracasso foi o resultado das limitações próprias da burguesia brasileira, marcada pela tendência à conciliação e à capitulação, como conseqüência lógica de suas condições de classe e pelo seu entrelaçamento com o imperialismo e o latifúndio.
Como conseqüência das soluções formuladas pela burguesia e, simultaneamente, como solução em si, o máximo que a burguesia brasileira conseguiu foi dar ao país um desenvolvimento econômico. Embora dependente do imperialismo, tal desenvolvimento significou um progresso e um passo para a frente. Mas seguiu-se aqui a lei da acumulação capitalista, o que — por isso mesmo — não deixou de significar um enorme sacrifício para as grandes massas, o aumento da sua pobreza e exploração, sobretudo quando se trata das massas rurais.
O balanço das soluções aplicadas pela burguesia — inclusive a solução desenvolvimentista — e o exame dos tipos de soluções postos em prática ou tentados pela classe burguesa brasileira mostram seu conteúdo nada popular, na maior parte das vezes uma tendência antidemocrática e, de um modo geral, o fracasso ante as forças combinadas do imperialismo, do latifúndio e do golpismo.
Ao dar curso às suas soluções, a burguesia tem se revelado incapaz na condução do processo brasileiro, quer pela inaptidão para afastar o imperialismo norte-americano de nosso caminho, quer pela impossibilidade de eliminar o latifúndio e as contradições acumuladas e agravadas no país nessas três fases da crise geral do capitalismo.
No processo político brasileiro, aliás, há dois fatos marcantes a assinalar. Um deles é que, sempre que houve avanço, conquista de direitos sociais e progresso, combate ao imperialismo e ao latifúndio, isto se deveu preponderantemente à presença atuante do proletariado.
O outro fato é que — depois do Estado Novo — o impacto mais sério que interrompeu o processo verificou-se com o golpe de 1.° de abril.
Todos estes fatos se devem sobretudo às conseqüências, contradições e erros gerados pelo uso exclusivo do binômio burguesia-proletariado, que — por sua própria natureza — anula a participação política do campesinato no processo.
Quem tem a vocação, o destino histórico e as condições para resolver a crise crônica brasileira é o proletariado com os seus aliados da frente única. Atraindo o camponês — seu aliado fundamental — e incorporando-o à luta política, criando uma força própria, de base, para fazer crescer a frente única e dar-lhe conseqüência, desencadeando lutas, paralisando a influência vacilante da burguesia, ainda que mantendo a aliança com ela na atual etapa histórica, o proletariado brasileiro reúne em suas mãos os meios, condições e elementos necessários à saída exigida pelo nosso povo.
É desta forma, e dentro de tal equacionamento, que o binômio nacionalismo-democracia terá um enfoque adequado e a dimensão que o levará a equiparar-se às exigências e necessidades da nação brasileira. Só disputando a hegemonia à burguesia, nosso proletariado poderá fazê-lo.
O proletariado brasileiro já formulou à sua maneira uma das soluções da nossa crise crônica, participando do processo evolutivo nacional, depois de ter intentado o caminho revolucionário e insurrecional da Aliança Nacional Libertadora, em 1935.
Por que isso aconteceu — eis um fenômeno diretamente relacionado com o nosso proletariado em si mesmo, desde suas origens e aparição como classe, até sua transformação em classe para si. As singularidades de tal processo, as condições que levaram à constituição da vanguarda do proletariado — como resultado do transbordamento de seu nível de consciência ao grau mais elevado — constituem matéria de que nos fala com maestria Astrojildo Pereira em sua obra "Formação histórica do PCB", a cujo estudo é necessário recorrer.
Na França, Inglaterra, Alemanha, Itália, Estados Unidos e outros países importantes, o proletariado surgiu — como classe em si e para si — concomitantemente com a indústria de base e a revolução industrial, que caracterizou a era moderna.
O proletariado brasileiro, porém, só surgiu, com o seu ramo da indústria básica, muito mais tarde, na época da Segunda Guerra Mundial.
Foi exatamente em tais circunstâncias, e em conseqüência delas, que as palavras-de-ordem patrióticas, nacionalistas ou antiimperialistas e de sentido liberal e democrático alcançaram enorme vibração e receptividade em todo o país. O proletariado brasileiro cresceu e agigantou-se, fortaleceu-se com seu setor básico industrial, sob o influxo das grandes campanhas nacionais pró siderurgia, em favor do petróleo, pelo monopólio estatal, em defesa das riquezas minerais e pela expansão da indústra elétrica, em defesa da indústria nacional, contra o fascismo, pelo envio da FEB à Europa, pela Constituinte, em defesa da democracia e das liberdades democráticas, contra o golpe, contra o envio de tropas à Coréia, em defesa da paz e contra a guerra.
Foi sob a égide do binômio nacionalismo-democracia que o proletariado brasileiro pôde desempenhar um papel político, à medida que se intensificava o processo de sua expansão no quadro das forças produtivas.
Tanto no plano econômico como no político, o processo evolutivo brasileiro e seu expansionismo desenvolvimentista foram conduzidos por um setor da burguesia, preponderantemente industrial.
Para os comunistas — como de um modo geral para as esquerdas — isto significou um largo período de colaboração com as forças da burguesia. A necessidade da luta antiimperialista e a obrigatoriedade do combate às forças golpistas, que se opõem ao progresso e à liberdade, colocaram as forças populares e nacionalistas e sua liderança revolucionária numa posição de dependência face à burguesia brasileira.
Poderia ter ocorrido o contrário, mas isto dependeria de uma aplicação mais correta do marxismo-leninismo à realidade brasileira, o que não aconteceu.
Condições históricas e peculiaridades da situação brasileira facilitaram a hegemonia da burguesia na condução do processo. Entretanto, a hegemonia da burguesia não é uma fatalidade histórica, e nada indica que o proletariado deva assumir uma posição conformista e curvar-se indefinidamente à liderança burguesa.
Tal subordinação foi possível, como vimos, porque a liderança revolucionária limitou sua ação até boje ao manejo do binômio burguesía-proletariado, que em nosso processo histórico tem condicionado o binomio nacionalismo-democracia.
Quando a liderança marxista restringe seu plano revolucionário, antiimperialista e democrático à unidade e à luta entre a burguesia e o proletariado, e apenas tem diante de si as duas classes aliando-se ou defrontando-se, é pouco provável que ocorra a vitória da revolução. A liderança permanece então em poder da burguesia. Mas essa liderança é vacilante e propensa à conciliação, sobretudo quando os interesses da burguesia são duramente feridos pelo imperialismo e o latifúndio, e ela teme o proletariado em luta contra esses dois inimigos.
Em qualquer caso, mas sobretudo em face do binómio burguesia-proletariado, nós — os que seguimos o marxismo-leninismo — não temos outro recurso senão construir a força do proletariado, para não ficarmos subordinados à burguesia.
A força do proletariado constrói-se trabalhando com ele mesmo, sem descanso, em sua base e, portanto, nas empresas industriais. Sem trabalho nas empresas, sobretudo nas empresas imperialistas e nas empresas dos ramos da indústria básica, não é possível fortalecer o proletariado.
Mas este não é o único fator da acumulação de força. Sejam quais forem as circunstâncias, o decisivo é ter trabalho no campo, é levar as massas rurais à luta, vendo no camponês o aliado fundamental do proletariado. A inconstância e o atraso do trabalho no campo constituem o lado fraco da revolução brasileira e da liderança marxista — o que tem provocado repetidos insucessos.
A crise brasileira chegou a um ponto em que o proletariado não pode pretender resolvê-la seguindo a fórmula anterior — caminho pacífico e apoio à burguesia na luta pelas reformas.
Este caminho, aliás, só poderia ter tido êxito no Brasil se a liderança marxista estivesse munida de suficiente lastro ideológico, que lhe permitisse dirigir a luta sem perder o sentido de classe ou desviar-se dos rumos da revolução. Aconteceu, porém, o contrário, e o caminho pacífico das reformas foi levado à derrota pelo golpe de 1.° de abril.
Agora, o caminho pacífico está superado. Persistir nele significa adotar uma estratégia que concorrerá para a institucionalização do golpe e da ditadura.
Tal institucionalização — que a ditadura procura levar a efeito — tem como objetivo paralisar o movimento de libertação do povo brasileiro, subjugar o proletariado e as forças populares e nacionalistas, e fazer do Brasil um satélite permanente ou duradouro dos Estados Unidos.
As teses da ocidentalização e da interdependência da soberania, aventadas a propósito da inevitabilidade da 3.ª guerra mundial, são a cobertura ideológica da institucionalização.
Esta a nova saída política que as classes dominantes — em colaboração com os Estados Unidos — buscam, depois do golpe de abril e em conseqüência dele, para evitar a ascensão das massas e a libertação do nosso país da esfera de influência norte-americana.
A adoção — mais uma vez — de um caminho pacífico por parte dos marxistas não lhes permitiria tomar a iniciativa, nem desencadear nenhuma ação decisiva contra a ditadura e sua pretendida institucionalização. E isto porque a ditadura está baseada na força, que é o principal elemento empregado contra o povo e contra a oposição. O único efeito de um novo caminho pacífico, tentado à guisa de solução da crise brasileira, seria impelir os marxistas a um erro de cálculo e a uma inevitável colaboração com a ditadura, em benefício dos interesses das classes retrógradas.
Ademais de ultrapassada — e portanto inoperante para as forças populares e nacionalistas — uma estratégia baseada no caminho pacífico acarretaria outro perigo.
Este outro perigo — cuja ocorrência não exclui o emprego da violência e da força militar por parte da ditadura — seria o envolvimento das forças populares e nacionalistas. Nesse caso, os marxistas — seguindo uma estratégia norteada pelo caminho pacífico — poderiam ajudar a transformar o Brasil num país social-democratico, exercendo em nome dos Estados Unidos o papel de freio do movimento de libertação da América Latina.
O caminho pacífico da revolução brasileira — no momento atual — teria o efeito de prosseguir alimentando ilusões no povo, e minaria o moral das forças populares e nacionalistas, que precisam de estímulo revolucionário.
Os fatos indicam que o proletariado — em face do tremendo impacto da abrilada — não tem outro recurso senão adotar uma estratégia revolucionária, que leve à derrubada da ditadura. Trata-se da revolução, da preparação da '"insurreição armada popular". Trata-se do caminho não pacífico, violento, até mesmo da guerra civil. Sem o recurso à violência por parte das massas, a ditadura será institucionalizada por um período de maior ou menor duração.
Sem uma estratégia revolucionária, sem a ação revolucionária apoiada no trabalho pela base e não exclusivamente de cúpula, é impossível construir a frente única, movimentar as massas e dar-lhes a liderança exigida para a vitória sobre a ditadura.
Uma estratégia revolucionária — indispensável para sairmos do marasmo e da pasmaceira — exige trabalho pertinaz com as forças básicas da revolução — o proletariado, as massas rurais, os intelectuais, os estudantes.
O trabalho com a burguesia — nessa estratégia — não pode ser o trabalho fundamental, ainda que não se trate absolutamente de abandoná-lo.
Uma estratégia revolucionária tem que levar ao rompimento com a política de subordinação do proletariado à burguesia, à separação entre o partido do proletariado e os partidos da burguesia.
Agindo como força independente, os comunistas — e de um modo geral as esquerdas brasileiras — terão um lugar ao sol e alcançarão êxito, arrastando as massas. As chamadas elites brasileiras já demonstraram seu fracasso. Seria para nós um desastre tentar qualquer saída que comprometesse nossa independência diante delas.
Atuando com as forças básicas da revolução, o trabalho mais importante, aquele que tem caráter prioritário, é a ação no campo, o deslocamento das lutas para o interior do país, a conscientização do camponês. No esquema estratégico brasileiro, o pedestal da ação do proletariado é o trabalhador rural. A aliança dos proletários com os camponeses é a pedra de toque da revolução brasileira. Ela significará um grande passo à frente — ou seja, a substituição do esquema burguesía-proletariado por um plano estratégico marxista. Nesse plano, o camponês e o campo desempenharão o papel decisivo no apoio à luta das massas urbanas. E é sob esse aspecto que se trata de abrir uma segunda frente. O que quer dizer que não devemos limitar nossa ação exclusivamente às cidades, onde, aliás, além dos entendimentos de cúpula, necessitamos de uma profunda penetração entre o proletariado nas grandes empresas. Isto é indispensável. Mas não haverá possibilidade de êxito estratégico, a não ser com a segunda frente, no campo.
Outro elemento básico no plano estratégico são as forças militares e o papel que desempenham na revolução — assunto de que nos ocuparemos em ensaio seguinte.
A possibilidade de cisão das forças militares — possibilidade prevista no complexo quadro político brasileiro — interessa ao plano estratégico como um fator provável da guerra civil. As forças populares e nacionalistas devem estar, então, prevenidas e providas de total independência, que lhes permita a mais ampla liberdade de ação, para não ficarem a reboque de uma ou outra das facções em luta.
A solução da crise crônica brasileira pela via armada — como solução advinda do proletariado — exige luta árdua e sacrifícios por parte da vanguarda. É uma solução de profundidade, visando sempre ao trabalho paciente, tenaz e contínuo com as forças permanentes da revolução. E conta com a possibilidade de apoio de amplas camadas, uma vez que cresce o descontentamento popular, e a ditadura acelera os passos para a institucionalização.
A experiência brasileira mostra a necessidade de insistir-se numa solução revolucionária.
Nas atuais condições históricas, renunciar à estratégia revolucionária é comprometer o futuro do Brasil e da América Latina.
A Hegemonia na Revolução e a Tática Atual
No Brasil — como já vimos — trata-se de resolver a crise crônica de estrutura. E esta hoje consiste num fato novo: seu conteúdo e sua evolução são engendrados pelo crescimento do capitalismo nas condições de dependência do imperialismo e da manutenção do latifúndio. É o crescimento do capitalismo — em tais circunstâncias — que vem determinando todo o processo político brasileiro.
Tal crescimento, é certo, não nos livra da condição de subdesenvolvidos. Mas a situação de nosso país mudou completamente. O Brasil já não é um país que sofre mais da falta de capitalismo do que do capitalismo.
O imperialismo norte-americano age no Brasil através de um setor do capitalismo brasileiro. Isto quer dizer o seguinte: apesar das contradições com os Estados Unidos, o capitalismo brasileiro vem sendo utilizado pelo imperialismo norte-americano, que se apoia fundamentalmente no setor entreguista da burguesia.
Uma parte do capitalismo brasileiro só vê saída enfeudandose aos Estados Unidos. A despeito da contradição com o imperialismo norte-americano, a outra parte é incapaz de enfrentá-lo.
O golpe principal contra o imperialismo norte-americano só pode ser desfechado se for derrubada a atual ditadura, cuja função consiste em representar os interesses do latifúndio e do setor da burguesia que reconhece a necessidade de apoiar-se nos Estados Unidos, e de seguir sua política de ocidentalização e de preparação da guerra mundial.
A contradição burguesía-proletariado ganhou nova dimensão. O que significa que não se pode lutar contra o imperialismo e o latifúndio alimentando ilusões na liderança da burguesia brasileira ou renunciando à luta de classes contra ela.
O proletariado brasileiro necessita de agir com independência, ainda que seja uma inelutabilidade histórica, no Brasil, a aliança do proletariado com a burguesia. O proletariado não pode ficar sob a hegemonia da burguesia, embora esta continue dirigindo o processo político, como conseqüência da liderança do processo desenvolvimentista brasileiro.
A questão fundamental do processo de conquista da hegemonia na revolução brasileira não está em reconhecer que objetivamente a burguesia tem dirigido e vem dirigindo o processo político. Não está em reconhecer que se deve lutar pela hegemonia do proletariado, enquanto esta hegemonia não está ainda em nossas mãos. Tudo isto é pacífico para gregos e troianos.
O problema fundamental consiste em que não é uma fatalidade histórica a liderança da burguesia brasileira na revolução. O problema fundamental reside em admitir a possibilidade de o proletariado brasileiro exercer a hegemonia na revolução, desde o primeiro momento, e lutar com decisão por essa hegemonia.
Tal possibilidade não modificará o caráter antiimperialista e antifeudal, nacional e democrático da revolução. Dar-lhe-á conseqüência.
Se desistirmos de lutar desde agora por transformar essa possibilidade em realidade, contribuiremos — na melhor das hipóteses, repetimos — para ajudar a burguesia brasileira a transformar o Brasil num país social-democrático na América Latina. Nesse caso, o Brasil teria o destino de auxiliar dos Estados Unidos na missão de refrear o movimento de libertação dos países latino-americanos.
O Estado que — no Brasil — resultar de uma revolução liderada pela burguesia será um Estado burguês, e não resolverá os problemas fundamentais da revolução — a expulsão do imperialismo e a abolição do latifúndio.
Nosso erro no governo João Goulart foi que não compreendemos isto, não preservamos a independência do proletariado e não lutamos por ela, e acreditamos na liderança da burguesia. Isto nos levou a uma derrota, conduziu a revolução a um fracasso, ainda que temporário.
O Brasil de hoje não é o de 1945, nem o de 1955, nem o de 1960. É outro Brasil, com a classe burguesa liderando o processo, dentro de uma situação internacional diferente daquela do após-guerra.
Nossa autocrítica não pode partir de uma posição falsa, fora da apreciação histórica da realidade brasileira. Não pode partir de um ângulo de classe não proletário. Não há profundidade em autocrítica que examine problemas políticos, deixando de lado a análise de nossa posição de classe.
A direção ideologica é a condição fundamental para o êxito da direção política. O que está havendo é a perda do sentido de classe, o desvio dos rumos da revolução brasileira.
Não se trata de reconhecer somente que fomos derrotados pelo golpe militar de 1.° de abril, que estamos fracos, que não temos movimento de massas, que não há lutas, e que a ditadura nos esmaga. Tudo isto é verdade.
Mas nossa obrigação é apresentar uma análise e uma saída concretas — elaboradas segundo um plano estratégico e uma tática marxistas.
Temos que empreender o caminho da estratégia revolucionária. Para isso é necessário derrubar a atual ditadura. O que não se pode conseguir esperando que ela venha a democratizar-se pela via eleitoral. Ou que possamos prosseguir lutando pela via pacífica, e que daí venha a surgir um momento em que a luta armada — como alternativa — se torne necessária ou a forma de luta principal.
No Brasil não se trata de escolher alternativas. A experiência diária está demonstrando que a ditadura em nosso país só se extinguirá pela força. O imperialismo norte-americano não ficará indiferente à derrota da ditadura ou de um governo pró-imperialista, como não ficou indiferente em São Domingos. Passará à violência e à intervenção armada, logo que sentir suas posições ameaçadas no Brasil. O imperialismo norte-americano não cederá sem luta o posto avançado que conquistou em nosso país, através do golpe militar.
O caminho da estratégia revolucionária é norteado por uma perspectiva básica, entendendo-se como tal a perspectiva que considera esgotadas ou fechadas as possibilidades de solução pacífica, e admite que não haverá outra solução senão a força para a derrubada da ditadura.
Mas não basta uma estratégia revolucionária para que as forças populares e nacionalistas sejam lançadas à luta. É necessário também que disponhamos de uma tática atual. E esta, ao ser traçada, será coerentemente uma dependência da estratégia. Ou melhor, haverá uma interdependência, um condicionamento entre uma e outra.
É impossível traçar uma tática dúbia que tanto sirva para uma saída pacífica como para uma saída não pacífica. A dubiedade da linha tática é que leva a uma rápida deterioração das palavras-de-ordem, e à perplexidade repetida em face dos acontecimentos.
Ninguém acredita que se possa convidar as massas agora para a insurreição popular. Não haveria nada. Também ninguém verá vantagem em enfrentar a ditadura, desencadeando lutas e suportando violência, se afirmarmos que nossa perspectiva é uma saída pacífica. É como prometer o céu aos que sofrem na terra.
Uma tática decorrente da estratégia revolucionária é por si mesma revolucionária, o que nada tem a ver com sectarismo e esquerdismo. Trata-se de levar as massas à luta contra a ditadura, e substituí-la por um governo efetivamente democrático. Os meios empregados são os que as massas aceitam. Mas os comunistas devem dar exemplo do impulso revolucionário, que não se obtém — evidentemente — baseando nossa luta numa perspectiva pacífica.
A tática revolucionária abrange todos os aspectos da luta política, e, ao mesmo tempo, sabe manejar as forças básicas da revolução. É uma tática acessível, uma tática de massas, ao alcance da compreensão comum, não uma tática de privilegiados, de iluminados, de donos da revolução, de manipuladores de fórmulas feitas. Não uma tática que a cada fato político novo ensaia explicações complicadas, emitindo diretivas que realmente não levam a nada, não despertam o entusiasmo revolucionário, nem conduzem a luta nenhuma, como vem acontecendo nestes dois anos de ditadura. Não uma tática destinada a fazer entendimentos políticos e eleitorais, alimentando ilusões na burguesia, cedendo ao conformismo e disseminando a passividade. A tática revolucionária é uma tática de lutas de massas e para lutas de massas, e seu objetivo principal consiste em nos aproximar dos objetivos estratégicos aos quais ela está subordinada. Trata-se de uma tática que conduza à derrubada da ditadura através da força da frente única, entendendo-se a derrubada da ditadura como o objetivo principal, destinado a levar à consecução dos objetivos estratégicos das forças populares e nacionalistas.
Pelo fato de decorrer de uma estratégia revolucionária e estar a seu serviço, a tática atual não exclui que continuemos inseridos no processo político brasileiro. Não exclui a luta acirrada pela frente única antiditadura. E o aproveitamento das mínimas possibilidades legais. E a utilização de qualquer brecha surgida no processo, que leve mais uma vez ao desmascaramento da ditadura e da farsa eleitoral.
Não exclui nossa participação nos conflitos das classes dominantes e de suas forças militares, onde poderão ocorrer fendas e rachaduras, choques violentos e, em conseqüência, até a guerra civil.
O inadmissível é seguirmos a reboque do atual processo político, não estabelecermos as premissas que colocarão a iniciativa política em nossas mãos e nas mãos das massas.
Estas premissas exigem o persistente trabalho nas empresas industriais, a prioridade para o trabalho do campo — alicerce da aliança operário-camponesa — o trabalho nas forças militares, o trabalho entre os intelectuais.
Tais são os elementos permanentes da tática marxista, que concorrerão para criar a força organizada do proletariado. Sem esta força, é impossível influir no processo político e obter qualquer vitória tática de importância, e com repercussão no processo revolucionário. O processo de criação da força do proletariado exige lutas nas áreas urbanas e nas áreas rurais. Entretanto, o elo que levará ao desenvolvimento da luta contra a ditadura, e que produzirá a mudança de qualidade do movimento de massa, está nas lutas camponesas.
Daí a importância do trabalho de campo na aplicação desta tática. Esta importância decorre do fato de que, pela primeira vez, no processo revolucionário brasileiro, se tornará possível unir a luta política das cidades à luta política do campo.
O caminho da derrubada da ditadura através da luta de massas não terá conseqüência nem dará resultados, a não ser eliminando o desprezo pelo trabalho no campo, e adquirindo a compreensão da importância do campesinato no processo em curso. Não se pode fazer a luta pela democracia e pelas reivindicações nacionalistas, separando uma e outra da luta pela terra e pelos interesses das massas camponesas. É um erro relegar para o momento da decisão estratégica o processo de luta visando a atrair a massa camponesa.
O trabalho no campo é trabalho tático. É o elemento essencial, fundamental da tática do proletariado.
Sobre alguns Princípios da Tática nas Atuais Condições Brasileiras
Ademais dos elementos permanentes da tática marxista, que concorrerão para criar a força organizada do proletariado, há princípios gerais e particulares, aos quais obedece a tática, nas atuais condições brasileiras.
Esses princípios dizem respeito às regras e leis confirmadas pela prática e relacionadas com o manejo e a mobilização dos elementos, permanentes da tática, incluindo a frente única.
Dentre tais princípios, o da retirada tem um grande significado. Em nenhum momento, qualquer passo tático deve ser empreendido sem a garantia da retirada. Quanto ao princípio da ofensiva, a experiência ensina que não é obrigatório avançar sempre, desde que, em determinadas circunstâncias, estejamos obtendo vitórias ou êxitos parciais. Necessariamente, há um momento em que devemos parar e consolidar nossas forças, a fim de, em seguida, prosseguirmos avançando.
Quando a ofensiva política é do inimigo, as forças revolucionárias devem procurar abrir outra frente política sob a direção do proletariado. Esta outra frente — destinada a retirar a iniciativa ao inimigo — pode ser em qualquer área. Mas só concorrerá para a mudança de qualidade da luta política, se for uma frente de luta aberta no meio rural, entre as massas camponesas.
Outro princípio importante tem relação com o problema da força do proletariado. Quer dizer, ao tomar qualquer iniciativa política, o proletariado deve ao mesmo tempo empenhar-se em criar sua própria força. A força do proletariado reside no seu trabalho ideológico e político nas empresas industriais, entre os camponeses, as forças militares, os intelectuais, estudantes e mulheres, entre a juventude e, principalmente, entre as camadas médias nos grandes centros urbanos.
Um dos princípios corretos do acerto tático é que o proletariado jamais deve renunciar a criar sua força própria e a fortalecer-se pela base, desde o primeiro momento em que participa da frente única. Sem isto, o proletariado não assegurará sua independência. Sem força própria, o proletariado será um joguete nas mãos da liderança burguesa.
Para que a força do proletariado seja utilizada de modo correto, deve haver uma combinação do trabalho nas empresas industriais com o trabalho no campo e entre as forças militares. Se esta combinação não for estabelecida, a tática do proletariado sofrerá uma distorção. É impossível a vitória do proletariado sozinho — sem a frente única antiditadura e sem a base operário-camponesa para a frente única.
A greve geral política nacional do proletariado, sem o apoio dos camponeses e dos elementos militares revolucionários, bem como das massas populares, dos estudantes, intelectuais e mulheres, não produz o resultado desejado, pois implica em lançar o proletariado sozinho à luta.
A vitória do proletariado é impossível se — por outro lado — o movimento revolucionário depender exclusivamente das lutas camponesas isoladas das lutas urbanas. Ou somente da luta militar ou de um dispositivo de cúpula militar-sindical.
No que se refere às forças militares, é impossível obter qualquer êxito entre elas se o trabalho no seu interior estiver sob a influência da ideologia da burguesia ou do nacionalismo revolucionário, em vez de estar sob a influência da ideologia do proletariado.
Sempre que se trata da frente única, tenha-se em conta que ela não pode ser vista somente em termos de partidos ou ex-partidos políticos opostos à ditadura. É necessário ver as forças de classe da frente única e as tendências e forças políticas ou agrupamentos que as representam, sem excetuar os líderes e as lideranças.
Um princípio importante — sob esse aspecto — é o da existência de três agrupamentos de forças da frente única. No centro estão as forças intermediárias, ou sejam, as forças mais numerosas da burguesia e seus afins. À esquerda estão as forças radicais. E no extremo oposto as forças de direita da frente única.
Sem levar em consideração tal princípio, torna-se difícil atuar na frente única.
Antes de mais nada, é impossível desenvolver o trabalho de frente única com resultados positivos, limitando nossa atividade a uma ação de cúpula ou a entendimentos com a liderança das forças intermediárias. Com a cúpula não se consegue a vitória. O fundamental — nesse caso — é o trabalho de base, o que exige persistência e determinação da liderança do proletariado.
Outra questão é o princípio da unidade e luta com a burguesia dentro da frente única. Tal princípio só pode ser aplicado se o proletariado desencadear a luta de classe e souber conduzir com acerto a luta de massas nacionalista e democrática, na qual se inclui a luta pela terra. O proletariado deve assumir uma posição revolucionária clara, não lhe cabendo, em nenhuma hipótese, o papel de força moderadora da frente única. Quando isto acontece, o proletariado fica a reboque da burguesia.
Nosso papel, entretanto, não é atacar as forças intermediárias para destruí-las, nem desfechar sobre elas o golpe principal, desviando-o do alvo imperialista. O perigo é nos aliarmos somente a elas e deixarmos de lado as forças radicais. Ficaremos então à mercê das forças intermediárias.
É incorreto subestimar a união com as forças radicais. O radicalismo brasileiro é fruto do avanço do movimento revolucionário ou da resistência extrema à ditadura. Apresentando uma estratégia revolucionária e uma tática coerente com tal estratégia e a ela subordinada, faremos das forças radicais da frente única um aliado do proletariado.
Trata-se da unidade com a esquerda. Um dado valioso para essa unidade — tendo em vista atrair o centro — é a aliança com os católicos, e em particular com a esquerda católica. Ademais disso, com o mesmo fito, é imprescindível nossa união com os nacionalistas revolucionários, os partidários de Brizola, Arraes, Julião e outros, e bem assim com as demais correntes esquerdistas contrárias à ditadura. Nesse particular, o Nordeste merece uma atenção especial. Os intelectuais, por sua notória resistência ao terrorismo cultural e à ditadura, tendem à esquerda, e a união com eles assume um caráter de obrigatoriedade.
Depende da unidade com a esquerda o êxito da unidade com as forças do centro opostas à ditadura, desde as que obedecem ao comando de Jango, às que são lideradas por Jânio, Kubitschek e outros.
O proletariado não pode renunciar à aliança com o centro da frente única. Mas, se recusar a aliança com a esquerda, não terá força para atrair o centro e unir-se com ele.
Outro princípio tático importante, relacionado com a frente única, é o princípio da unidade de programa e de ação. O ponto de partida em tal princípio é a concordância da frente única no que diz respeito à derrubada da ditadura. Subentende-se, em virtude disso, que o fundamental para o objetivo em vista é a própria frente única antiditadura. Esta frente única deve ser a mais ampla possível e contar com todas as forças políticas e forças de classe opostas à ditadura, sem nenhuma exclusão.
Mesmo no caso dessas forças agirem cada uma de per si, é imprescindível que todas as ações convirjam para o principal objetivo — ou seja, a derrubada da ditadura.
O princípio da unidade de programa e de ação não importa, entretanto, em quebra da autonomia de nenhum agrupamento ou força da frente única, nem exclui o direito de crítica mútua e construtiva.
Em qualquer caso, o proletariado e juntamente com ele os comunistas devem desencadear e apoiar lutas contra a ditadura, e, por este meio, conduzir à luta as forças populares e nacionalistas.
Na luta contra a ditadura, devemos procurar empenhar as forças básicas da revolução antimperialista e antifeudal, nacional e democrática. Dentre as forças básicas, devemos destacar os camponeses. Estes não devem ser lançados à luta somente no momento da conquista do poder estatal revolucionário, ou seja, no momento da decisão estratégica. E preciso fazê-lo desde já, o que indica a importância das lutas camponesas, das reivindicações do homem do campo e de sua participação na luta nacionalista e democrática. Isto indica também a importância da luta pela terra e da participação do campesinato na luta política contra a ditadura e por sua derrubada.
Tal maneira de se proceder não significa — segundo pensam alguns — nem a mudança do caráter da revolução, que continua sendo antimperialista e antifeudal, nacional e democrática, nem a predominância da contradição agrária sobre a contradição nacional, antimperialista.
A visão estratégica da etapa histórica prossegue sendo a mesma, uma vez que as contradições postas em equação não foram resolvidas até agora.
Para o desenvolvimento das lutas, o princípio básico é a combinação das formas de luta e organização legais e ilegais, e a utilização de todas e quaisquer possibilidades legais, no terreno da defesa das reivindicações nacionalistas e democráticas, inclusive componesas, no terreno da política interna ou externa, ou no terreno jurídico.
Isto implica em atuar com firmeza onde quer que haja massas — nos sindicatos, nas organizações populares, feministas, estudantis, camponesas e quaisquer outras. O objetivo de tal atuação é desencadear e apoiar lutas e estimular a combatividade das massas.
O princípio da combinação das formas de luta e organização é subordinado à compreensão e ao reconhecimento da importância das lutas camponesas, cujo desencadeamento exige a abertura de uma segunda frente na luta política do Brasil.
O princípio fundamental da tática marxista é que, em qualquer fase da luta do proletariado, torna-se obrigatório lutar pela conquista de um tipo de governo, ou melhor, de um poder que abra caminho para a completa libertação nacional, econômica, política e social do povo. Quer dizer, que abra caminho para a solução do problema estratégico.
Nas condições brasileiras, é indispensável lutar por um governo que substitua a atual ditadura. Tal governo deve ter características realmente democráticas. Deve ser o oposto do que aí está.
A essa tarefa ficam subordinadas as demais tarefas táticas.
A tática dos comunistas — baseada no princípio de que a hegemonia da revolução deve estar com o proletariado — tem hoje um caráter completamente diverso da tática anterior. Aquela era condicionada pelo desenvolvimento pacífico. A atual é condicionada pela perspectiva básica de que a ditadura só será alijada pela força, e de que em qualquer caso teremos de enfrentar a violência e agressão armada do imperialismo dos Estados Unidos.
Enfrentamos uma situação inteiramente nova. A tática tem que ser outra.
Rejeição da Tática que subordina o Proletariado à Burguesia
O proletariado não pode seguir uma tática qualquer. A tática que não convier à conquista dos objetivos estratégicos da revolução antimperialista e antifeudal, nacional e democrática, deve ser repelida.
Toda tática que, na nova situação do país, pretender prosseguir subordinando ideologicamente o proletariado à burguesia é uma tática condenável.
Que essa tática existe não é novidade para ninguém. Ela é o resultado da influência ideológica da burguesia no seio do proletariado.
Torna-se necessário conhecer suas características, para combater sua penetração no meio revolucionário.
Trata-se da tática que se limita a ver a aliança do proletariado com o centro da frente única, e permanece indefinidamente nestes marcos estreitos.
Sua maneira de ser é fruto de uma concepção reboquista, por falta de confiança no proletariado. Seu ponto de partida está em reconhecer que, objetivamente, o processo político brasileiro se desenvolve sob a direção da burguesia. E disso não se liberta.
É a tática que busca uma saída moderada, teme as lutas radicais e uma solução revolucionária, para não desgostar a burguesia e manter com ela uma colaboração duradoura.
A tática a que nos referimos segue religiosamente os cânones teóricos do passado, e não vê possibilidade para o desencadeamento da revolução, a não ser quando existam as condições pré-revolucionárias clássicas. A revolução cubana já pôs por terra este conceito tradicional, mas a citada tática ignora os fatos novos.
No que diz respeito à autocrítica, essa tática não parte de um ponto de vista de classe. Rejeita a idéia de que a causa principal do erro dos comunistas, anteriormente, foi a ilusão na liderança da burguesia. Recusa-se a admitir que ficamos basicamente sob a liderança da burguesia e a seu reboque, e perdemos a autoridade sobre as massas, dando-lhes a falsa idéia de que estávamos no poder e éramos a mesma coisa que João Goulart.
Em conseqüência da subordinação ideológica à burguesia, acabamos caindo na política de apoio aos atos positivos de Goulart e de combate aos seus atos negativos. Isto é errôneo. E o erro consiste — nesse caso — em esperar pelas iniciativas da burguesia. Consiste em nada fazer para sair do conformismo.
Não se trata de recusar a frente única com a burguesia. Mas uma das condições típicas dessa aliança é — de nossa parte — lutar para que a hegemonia seja do proletariado e este não fique a reboque da burguesia.
A tática que combatemos não se preocupa com tais coisas. Seu grande empenho — inspirado na idéia de que somos uma força moderadora — tem outro sentido, visa significativamente a chamar a atenção para o desvio esquerdista.
Na verdade, o esquerdismo foi fruto extemporâneo da ilusão de classe, que não permitia ver a impossibilidade da conquista de um programa avançado, confiando na burguesia, em vez de confiar na luta pela base.
Atribuindo ao esquerdismo a responsabilidade principal por nosso erro, a tática em causa não deixa de desferir alguns ataques ao desvio direitista — pelo menos para guardar as aparências.
O único resultado que consegue — por esse caminho — é dividir as fileiras do proletariado em duas facções — esquerda e direita. Mas não convence ninguém. E o pior de tudo é a fuga ao exame da causa principal de nosso erro, que foi a perda do sentido de classe.
Desistindo de reconhecer que nosso mal maior é tentar prosseguir com o cordão umbilical atado à burguesia, a tática referida teme aceitar como perspectiva básica a derrubada da ditadura pela força.
Esta perspectiva é concreta, pois as condições brasileiras mostram claramente que — sem o emprego da força — não há como derrubar a ditadura. Mesmo em face de outras alternativas, será sempre necessário o uso da força, pois o imperialismo norte-americano agirá pela violência ao sentir seus interesses ameaçados.
A tática que citamos, entretanto, admite isolar e desagregar a ditadura a tal ponto que ela se torne impotente para empregar a violência contra o povo, e seja derrubada sem que a luta armada se torne a principal forma de ação.
Essa tática aceita uma tal saída porque continua alimentando ilusões na burguesia, e espera que, das contradições entre as classes dominantes, surja um desfecho favorável ao povo, sem o apelo a lutas radicais.
Não é por outro motivo que a mencionada tática — para fugir à apresentação do caminho violento de derrubada da ditadura — insiste em falar no caminho da luta de massas. Seria este o caminho indicado para levar a ditadura à derrota.
Todos sabem que falar em caminho da luta de massas para derrubar a ditadura é a coisa mais elementar e menos controvertida hoje em dia. O que todos querem saber é como será tal caminho.
A tática a que nos referimos define o caminho da luta de massas para a derrubada da ditadura como sendo a participação nas eleições, protestos, greves e manifestações. Como coroamento desse caminho, preconiza contra a ditadura uma greve geral, nacional, política, sem recorrer à luta armada, à insurreição popular ou à guerra civil.
Julga possível, assim, nas condições atuais do país, a vitória de um processo político — com eleições, greves, manifestações e protestos em que a ação decisiva das massas venha a ser exercida pacificamente.
Estamos aqui no pleno reinado das ilusões de classe, para não falar num reinado do Dr. Pangloss(1). Tal ilusão só se explica em virtude da tática que apreciamos acreditar que uma das facções das classes dominantes acabará buscando, ela própria, a ajuda do proletariado, para livrar-se da oposição ou da ameaça de outras facções, também em luta pela supremacia política.
A derrota da ditadura seria, assim, o resultado da luta e da liderança da própria burguesia ou de um setor burguês, que acabaria apoiando-se no proletariado, e evitando o derramamento de sangue ou a luta violenta.
Por mais incrível que pareça, a tática aqui exposta também se refere à luta armada. E até insiste muitas vezes em tal forma de luta. Apesar disso, faz-lhe uma ressalva. É quanto ao momento de sua utilização. A tática em tela esclarece persistentemente que não se há de recorrer agora a tal forma de luta e, sim, somente quando ela se tornar oportuna e vier a ser a forma de luta principal.
Essa maneira de enfocar a questão denota que a tática em referência pretende queimar os últimos cartuchos para obter uma derrubada pacífica da ditadura, mesmo ao preço da sujeição ideológica do proletariado à burguesia.
Frustrado, porém, o caminho da solução pacífica, só aí então — segundo a tática exposta — seria o momento da luta armada.
Ao adotar semelhante critério, essa tática confunde formas de luta com o caminho tático.
A questão não está em definir formas de luta, enumerá-las, selecioná-las — aceitando umas e rejeitando outras. Não está igualmente em aceitá-las todas.
A questão está no caminho tático, e este caminho consiste em saber qual o elo que levará à derrubada da ditadura, com o emprego da ação de massas e o reforçamento da posição independente do proletariado.
O elo só pode ser o trabalho de campo, a penetração profunda no meio rural brasileiro, a preparação e o desencadeamento das lutas camponesas, com todas as conseqüências decorrentes das ações que contrariam o imperialismo e o latifúndio.
A tática a que nos reportamos despreza o papel do camponês na luta contra a ditadura, exatamente pelo temor da radicalização do processo político.
Daí porque — ao tratar do programa de lutas — só apresenta reivindicações relacionadas com o nacionalismo, com as liberdades democráticas e os interesses do proletariado. As reivindicações camponesas são omitidas. A luta pela terra é relegada para o momento da luta pelo poder estatal revolucionário.
Esta maneira de proceder indica que a tática em alusão só acredita em lutas urbanas, e isto implica em persistir na idéia de lançar o proletariado à luta sem o apoio do campesinato, como tem acontecido até agora no movimento revolucionário brasileiro. A tática aqui exposta não vê que o camponês é o fiel da balança no Brasil, como em toda a América Latina.
Quanto ao problema das eleições, a tática referida avalia-o mal e erroneamente, porque não confia no proletariado e prosterna-se ante a burguesia e sua liderança.
Todos vêem que o caminho da derrubada da ditadura não pode ser por via eleitoral. E esta é uma tese provada pela experiência, eis que a ditadura — valendo-se da força, isto é, dos atos institucionais e complementares — transformou as eleições numa comédia, para não falar em patomima.
A tática em causa quer, entretanto, que pelas eleições sejam infligidas derrotas parciais que debilitem o regime, apressando sua derrocada. O meio para isto seria o apoio às forças contrárias à ditadura e que mereçam a confiança do povo. Não sendo possível, tratar-se-ia de votar em branco e desmascarar a farsa eleitoral.
Depreende-se daí algo de curioso: a tática que citamos ainda não considera suficientes os instrumentos já adotados pela ditadura que invalidam as eleições e fecham as possibilidades de uma saída eleitoral, com a participação e a vitória de candidatos da confiança do povo. E isto é evidente, desde que — como tal — não podem ser classificados senão os candidatos aceitos pela ditadura ou com ela comprometidos. São estes, aliás, os únicos aptos a escapar das cassações e de outras leis e métodos fascistas.
Esperar que das eleições convocadas pela ditadura surja a possibilidade de infligir-lhe derrotas parciais, debilitar o regime, apressar sua derrocada e retomar o processo democrático — sem o persistente trabalho para desencadear lutas e chegar assim ao efetivo desmascaramento do atual governo — significa impelir o povo para o beco sem saída das ilusões eleitorais. O que levará o proletariado e as massas a navegarem ingloriamente nas águas dos candidatos da ditadura, ou dos que pretendem salvar a quartelada de abril, depois que sentiram na própria carne a repulsa do povo ao governo e sua política.
A tática que mencionamos não oferece melhor solução em face do problema sucessório, e levará o movimento revolucionário a outra estrondosa ilusão ou à estagnação no charco da pusilanimidade burguesa.
Em referência às crises de governo, a tática em pauta firma posição partindo do fato que novos golpes podem ocorrer.
A possibilidade de novos golpes é real. Mas a tática citada quer — nesse caso — a intervenção das forças populares para impedir uma "solução reacionária" com o fortalecimento de Castelo, ou a substituição de golpistas.
Tal posição demonstra que essa tática não julga Castelo suficientemente reacionário nem bastante forte, o que, entretanto, poderia vir a acontecer com o golpe. A outra alternativa para uma "solução reacionária" — ainda segundo a mesma tática — seria a subida de novos golpistas ao poder.
O fundamento ideológico dessa posição tática é norteado pela ilusão na situação atual e pela esperança na sobrevivência de uma reviravolta da própria burguesia, reviravolta destinada a pôr em ordem a situação política e ensejar uma escalada democrática.
Em resumo, as características e os aspectos da tática a que aludimos mostram que o proletariado nada tem a fazer com ela e que — se porventura viesse a cometer o equívoco de adotá-la — continuaria perplexo e vagueando por aqui e por ali, sem orientação em face dos constantes atos institucionais e complementares dos militares empoleirados no poder.
Eis porque o combate à subordinação ideológica do proletariado à burguesia e, em conseqüência, a rejeição de uma tática baseada nesse princípio constitui um elemento fundamental para levar-se a bom termo a luta pela derrubada da atual ditadura.
O Proletariado e as Forças Militares
O proletariado jamais pode desdenhar as forças militares. E diante delas é obrigado a tomar posição, adotando uma política.
A este propósito, num dos seus trabalhos sobre "O papel da violência na História", Engels afirma o seguinte:
"Em política não há senão duas potências decisivas: a força organizada do Estado, o exército, e a força desorganizada, a força elementar das massas populares".
Assim, segundo o conceito marxista, as forças militares são a força organizada do Estado.
Para que o proletariado defina sua posição perante elas, é necessário, antes de mais nada, encará-las como parte integrante do aparelho do Estado, seu setor armado, instituído e organizado com o fito de assegurar o domínio das classes que o Estado representa.
Conforme a natureza do Estado, assim será a natureza de suas forças armadas. O Estado jamais organizará ou permitirá forças militares que a ele se oponham, ou lhe contrariem a finalidade de dominação de classe. As forças militares têm uma função repressiva, conservadora. Este o seu conteúdo de classe.
O Estado brasileiro organizou suas forças militares, e ao longo da História as tem utilizado com a finalidade expressa de garantir a dominação das classes dirigentes do país.
As forças militares brasileiras — dentro da finalidade a que se destinam — apresentam, entretanto, um aspecto significativo: elas refletem também as contradições de classe da sociedade em que vivemos.
Este fenômeno é conseqüência da própria contextura das forças militares. Como instituição, elas não podem deixar de contar no seu seio com elementos das várias classes da sociedade brasileira.
Em nossa infra-estrutura militar, a parcela preponderante origina-se do proletariado e do campesinato. A elite dirigente militar, porém, procede da pequena burguesia, da burguesia e dos latifundiários.
O processo de avanço do capitalismo no Brasil, sem despojar-nos da condição de país subdesenvolvido, mas com repercussão nos fatos políticos, concorreu para modificações na composição e evolução das forças militares. Em certos momentos e sob determinadas condições, como no governo de João Goulart, elementos não aristocráticos ascenderam a setores de comando militar até então impenetráveis a um acesso plebeu.
A despeito de tal fenômeno, as forças militares têm mantido no Brasil a constância do conteúdo de classe do Estado.
É que as forças militares não são um todo amorfo, nem se limitam a refletir contradições da sociedade brasileira. O Estado dotou-as de um comando ideológico e político — um comando de classe — que não lhes permite mudar de rumo ao sabor dos acontecimentos. E instituiu para isso a hierarquia e a disciplina, como armas fundamentais para livrar as forças militares dos embates mais ou menos profundos, provocados pelos choques de classes da sociedade.
Nem sempre o Estado obteve êxito nesse seu propósito. A história registra momentos em que as forças militares foram levadas a mudar de posição. Isto se deveu ao fato de que as classes dominantes já não tinham condições de manter-se nas posições primitivas.
A abolição da escravatura e a proclamação da República são acontecimentos históricos que revelam como foi possível às forças militares mudarem de atitude.
É evidente que — refletindo os choques de classe da sociedade brasileira — as forças militares, por sua maioria, em contrapartida, influíram e pressionaram assim as classes dominantes. E, com isso, desempenharam objetivamente um papel dirigente.
Acontece que se tratava de um papel positivo, pois as causas abraçadas significavam um progresso, um grande passo adiante.
Semelhantemente, nos anos recentes, no período após-guerra, as forças militares desempenharam um papel positivo, quando se colocaram — por uma imensa maioria — a favor do monopólio estatal do petróleo e a favor de outros postulados de cunho nacionalista, e mesmo democrático (11 de novembro)(2).
As forças militares podem exercer esse papel quando não estão em jogo interesses que põem em xeque ou ameaçam o domínio das velhas classes dirigentes. Idêntica circunstância ocorre quando se extingue o poderio de velhas classes dirigentes, ou lhes é arrebatada uma parcela de poder. A condição exigida para isso é que não haja perigo de transferência de controle do Estado e de sua máquina para as mãos das massas.
A abolição da escravatura e a implantação da República, por exemplo, abalaram a velha classe dos escravocratas. Mantiveram, porém, o Estado brasileiro enfeudado ao domínio das classes exploradoras, sob o signo da conciliação entre burguesia e latifúndio, que se transformou em característica de nossa evolução histórica.
No caso da luta pelo petróleo e de certos pronunciamentos democráticos, que empolgaram a maioria das forças militares — como a defesa da Constituição no 11 de novembro — não havia risco de qualquer natureza para o Estado brasileiro, cuja estrutura permaneceu inalterável.
Em face, porém, do avanço das massas, ameaçando influir no poder, ou diante do perigo de mudança de qualidade na estrutura do Estado, as classes dominantes levantarão as forças militares contra as massas. Fá-lo-ão, desencadeando o golpe militar — como recurso extremo — para liquidar as liberdades democráticas. E, se necessário, simultaneamente, alijando do interior das forças militares os elementos suspeitos ou declaradamente favoráveis ao povo, isto é, ao nacionalismo e à democracia.
Foi o que ocorreu com o golpe de 1.° de abril de 1964, preparado, aliás, no interior das forças militares, com o estímulo, a inspiração e o apoio do imperialismo norte-americano.
É impossível deixar de relacionar os golpes militares no Brasil com a ação do imperialismo. E isto se tornou mais evidente a partir da Segunda Guerra Mundial, quando os Estados Unidos redobraram seu trabalho no seio das forças militares brasileiras.
A esse respeito, vale a pena relembrar o discurso que Adalgiza Néry pronunciou na Assembléia Legislativa do Estado da Guanabara, e que foi publicado no "Diário da Assembléia Legislativa" do mesmo Estado, com a data de 13 de novembro de 1964. Da leitura desse discurso podemos inferir as desastrosas conseqüências a que fomos arrastados pela assinatura e ratificação do Acordo Militar Brasil-Estados Unidos.
Significativo, também, é o que nos revela Nelson Werneck Sodré, em sua obra já citada "História Militar do Brasil", página 403, ao afirmar:
"O grande esforço do imperialismo, sem dúvida alguma, vem sendo desenvolvido nesse sentido: o de transformar as Forças Armadas nacionais em tropa de ocupação a seu serviço. Para isso, em todos os momentos, nos repetidos encontros de chefes militares em cursos especiais que oferecem, em viagens de estudo que proporcionam e, principalmente, valendo-se das missões militares, manipulam o anticomunismo. Acabar com o comunismo, e pela violência armada, constituiria, para todas as Forças Armadas do mundo "ocidental e cristão", a missão fundamental, conjugando-as como únicas, obedientes ao mesmo comando, despojadas de características nacionais, desinteressadas dos problemas específicos de cada um dos países a que devem servir. Essa continuada e minuciosa operação de lavagem cerebral, que não pode atingir individualmente e de perto cada indivíduo das Forças Armadas, tem atingido, realmente, e com êxito, determinados grupos delas, grupos especializados e por isso mesmo atingíveis: os do comando, os do Estado Maior, os de alguns serviços especiais. O que vem acontecendo, assim, entre nós, é a tentativa, rigorosamente planejada e executada, de ganhar o aparelho de comando das Forças Armadas porque, ganho este, como tais instituições operam por gravidade, isto é, de cima para baixo, por força da hierarquia e da disciplina, o resto vem como conseqüência. É preciso confessar que, realmente, o imperialismo vem conseguindo alguns êxitos espetaculares nesse sentido".
A influência e o domínio do imperialismo norte-americano no alto comando das forças armadas brasileiras exercem um papel altamente negativo.
Os fatos demonstram que, sobretudo em conseqüência disso, a tendência repressiva militar chegou a ponto demasiado elevado nas circunstâncias atuais.
É incontestável que, em decorrência de uma relativa composição pequeno-burguesa da elite militar, e em virtude do impacto que o conhecimento da realidade brasileira provoca em muitos homens dessa elite, uma plêiade de oficiais das forças armadas brasileiras passou-se ao marxismo. Seria, entretanto, absolutamente fora de sentido não ver a constância do surgimento — quase ininterrupto — de oficiais torturadores e espancadores, de feitio nazista, em que são abundantes as três armas.
O importante é assinalar que nas forças armadas foi crescendo uma tendência reacionária e fascista, culminando com sua predominância no alto comando militar e entre os oficiais golpistas responsáveis pela abrilada.
Tal tendência cresceu e estendeu-se até a decantada teoria da geopolítica e à tese da interdependência da soberania nacional. Uma e outra — diga-se de passagem — destinadas a dar cobertura aos interesses do imperialismo norte-americano, em detrimento do sentido nacional.
A despeito de que uma parte das forças militares não aceita a tendência mencionada e simpatiza com o nacionalismo, não se pode deixar de reconhecer que o miolo das forças armadas a ela se adapta, diante do pavor infundido pela campanha anticomunista.
Um erro comum dos comunistas e das forças de esquerda em geral foi a propaganda da tese de que as forças armadas brasileiras são democráticas ou têm tradição democrática. Semelhante tese — a julgar pelo papel dos militares no desempenho atual do poder através do balanço histórico de sua atuação permanente — não tem substância marxista. Constituiu, na verdade, mais uma ilusão difundida por aqueles que mais deveriam estar prevenidos contra ela.
Não tem substância marxista, porque o marxismo aprecia os fatos do ponto de vista histórico e do ponto de vista de classe. E, sob esses pontos de vista, as forças armadas brasileiras jamais deixaram de acompanhar as classes dominantes, e têm sido, até hoje, o instrumento destinado a protegê-las e salvá-las nos momentos mais difíceis.
É preciso insistir na tese de que as forças militares se identificam com o Estado e têm uma posição de classe definida, uma função repressora ante o movimento de massas e sua expansão.
É esta função coibitiva das forças armadas que sistematicamente dá origem, em seu interior, aos golpes militares antipovo.
Outra questão controvertida é saber se se pode obter o apoio das forças militares em seu conjunto para o triunfo da revolução no Brasil. A isto os marxistas respondem negativamente, pois o contrário seria fugir à tese de que as forças armadas em seu conjunto são um instrumento de repressão do Estado, e se identificam com ele. Não há nenhum exemplo histórico de triunfo da revolução com a ajuda total das forças militares do Estado completamente reacionário, ou simplesmente democrático-burguês, se a revolução em causa é popular, ou mesmo nacional e democrática, sob a liderança do proletariado.
Afastada a idéia de ganhar o conjunto das forças armadas para a revolução — o que constituiria um visionarismo — resta ao proletariado adotar uma política militar, cujo objetivo seja atrair para o lado da revolução uma parte das forças militares convencionais.
Tal objetivo é viável e pode ser atingido. Para isso, deve-se levar em conta que as forças militares são compostas de classes e refletem os choques, conflitos e colisões da sociedade brasileira, estando sujeitas a dividir-se e a fender-se.
E ainda que a maioria, no interior das forças armadas, prossiga sendo o esteio da reação, sempre há uma parte — por menor que seja — que se poderá ganhar contra a reação.
Ao traçar sua política militar, o proletariado rejeita, desde logo, colocar-se sob a hegemonia da burguesia, render-lhe obediência.
O comando da burguesia — mesmo nos momentos em que um dos setores burgueses no poder ou fora dele pretende realizar reformas — é um comando vacilante, temeroso das massas e do proletariado. É um comando que ensaia a luta, mas quando os golpistas das forças militares levantam a cabeça, acaba capitulando, como aconteceu no governo João Goulart.
Em matéria de política militar, o proletariado sofrerá um derrota inevitável sempre que subordinar sua ação à liderança da burguesia ou alimentar ilusões num dispositivo militar-sindical.
Este foi um dos erros capitais das forças populares e nacionalistas no curso do governo goulartiano, quando a política militar dessas forças esteve submetida à direção do setor burguês do Poder Executivo. Militares que seguiram essa política e acabaram sendo expulsos das forças armadas pela ditadura atual, em um documento bastante significativo, fazem autocrítica nos seguintes termos:
"Chegamos mesmo à posição reboquista, de deformação ideológica, ao supor que poderíamos manter um comando militar dentro do comando da burguesia".
Dentro do comando da burguesia evidentemente quer dizer: subordinado ao comando da burguesia. E, acrescentamos, é inútil ficar esperando pelas diretrizes do comando burguês nas forças armadas, pois essas sempre fracassam pelo medo da burguesia em dar chance ao proletariado.
No documento citado, os militares a que nos referimos chegam à conclusão de que a política militar de subordinação ao comando burguês levou-os à perplexidade diante dos acontecimentos do dia 31 de março de 1964, culminando com a incapacidade de resistir mesmo com aquilo de que ainda dispunham.
Os que adotam uma política militar reboquista fogem a uma posição de classe, fogem à essência do marxismo-leninismo. Fogem também ao espírito de classe do proleatriado os que pregam uma política militar esquerdizante. São os que afirmam que a política militar existe para comandar a luta armada e destruir o Estado e as próprias forças armadas.
Nas condições atuais, uma tal política dentro das forças militares leva ao isolamento dos seus propugnadores.
A verdadeira política militar existe como elemento tático permanente da estratégia revolucionária. E consiste em unir os elementos militares revolucionários sob a liderança do proletariado. Simultaneamente, uni-los com o povo, com o proletariado, com os camponeses. As lutas militares devem ser combinadas com as lutas operárias e camponesas, dentro da tática e da estratégia do proletariado, entendendo-se por lutas militares também a luta nacional dentro das forças armadas.
Quando falamos em elementos militares revolucionários, é exatamente porque nem todos os militares podem ser revolucionários, e só uma parte deles passará para o campo da revolução.
Por outro lado, ao nos referirmos às lutas militares, queremos distingui-las da luta armada, uma vez que esta última inclui também a participação do elemento civil e pode até assumir o aspecto de luta camponesa. Isto significa que a luta armada não é para ser desencadeada necessariamente sob a direção militar.
Uma política militar que só vê as forças armadas como uma coisa em si e só se dedica a enfrentar o trabalho político dentro delas, sem relacioná-las com o trabalho revolucionário extramilitar, não tem condições de êxito.
Estabelecidas estas premissas, e feita a ressalva de que a verdadeira política militar jamais deve subordinar-se ao comando da burguesia, resta conceituar as táticas de atuação no interior das forças armadas. Nesse sentido, o documento dos militares a que já referimos afirma o seguinte:
"Podemos conceituar as táticas de atuação nas forças armadas como uma tática legal, ampla, podendo-se caracterizar como uma tática de massas. Uma outra, clandestina, secreta, fechada."
Do ponto de vista amplo, de massas, é impossível impedir que os patriotas lutem dentro e fora das forças militares pela reformulação das tarefas impostas às forças armadas brasileiras. E é nessa tecla que o proletariado deve insistir, sem ceder às pressões e à vacilação da liderança burguesa, que teme defender para as forças armadas um programa nacionalista e democrático.
Elementos desse programa encontram-se no livro de Nelson Werneck Sodré, a "História Militar do Brasil", nas Conclusões, à pág. 404. A elas remetemos o leitor.
Em tal programa destacamos como fundamental levantar reivindicações democratizadoras de caráter profissional, ou melhor dizendo, a democratização da estrutura militar, e bem assim a nacionalização do equipamento material.
É o que Nelson Werneck Sodré situa com precisão na obra citada, pág. 407, ao dizer:
"Torna-se pacífica e de entendimento geral a compreensão de que o equipamento material das Forças Armadas jamais poderá ser convenientemente atendido enquanto fornecido de fora, e segundo interesses que não são os nossos. Trata-se de produzir tais equipamentos, de acordo com as nossas verdadeiras necessidades e colocando o aparelhamento das Forças Armadas na exata correspondência com o desenvolvimento material do país, e não mais através de processos de aquisição no exterior que se colocam na mesma linha e no mesmo sentido do processo de endividamento externo e de deterioração do comércio exterior que surge, hoje, com demasiada clareza para continuar a ser aceito e tolerado. Devemos, por isso, não apenas nacionalizar o material em uso, mas a técnica de sua produção, os princípios a que seu uso obedece, os conhecimentos a que está ligado".
Do ponto de vista de massas, estas e outras reivindicações alicerçam uma correta política militar. Do ponto de vista da tática fechada, basta citar o documento dos militares, já referido linhas atrás, quando afirma o seguinte:
"A tática conspirativa ilegal, no sentido primário, seria a existência de um órgão de comando coordenador independente e fora da máquina de comando da burguesia".
A conceituação das duas táticas no interior das forças militares não significa, entretanto, que elas atuem isoladamente. Pelo contrário, devem convergir para um único ponto: o isolamento da direita militar.
As Guerrilhas como Forma de Luta
A forma de luta geral que o povo brasileiro emprega contra a ditadura é a luta de resistência das massas. Torna-se dispensável aqui tecer outros comentários sobre a resistência como forma de luta geral do povo, eis que o assunto foi motivo de apreciação no livro "Por que Resisti à Prisão", no capítulo intitulado "O papel das forças populares e nacionalistas".
A luta de guerrilhas é — no caso brasileiro — uma das formas da luta de resistência das massas.
As guerrilhas são uma forma de luta complementar. Em si mesmas, elas não decidem a vitória final. Seja na guerra ou na luta revolucionária, elas pressupõem a existência de uma forma de luta principal. Em relação a tal princípio, os exemplos históricos das lutas de guerrilhas mostram o importante papel que elas desempenham na libertação dos povos e na derrubada das tiranias.
No Brasil, é conhecido o exemplo da luta de guerrilhas desencadeada contra a invasão dos holandeses. As guerrilhas dirigidas por Luiz Barbalho tiveram como objetivo eliminar as fontes de alimentos que abasteciam os invasores. Luiz Barbalho marchou do Rio Grande do Norte até a Bahia, passando por entre as linhas dos holandeses, e alcançou o sítio onde foi construído o forte de Barbalho, ainda hoje existente no bairro do mesmo nome, na cidade do Salvador.
A luta de guerrilhas de Barbalho foi combinada com a política de terra arrasada, o que — de fato — prejudicou o fornecimento de alimentos ao inimigo estrangeiro. Mas o que veio a decidir a situação, determinando a expulsão definitiva dos holandeses, foi, finalmente, a forma de luta principal — as grandes batalhas de Monte das Tabocas e dos Montes Guararapes, e o cerco dos invasores, com a conseqüente rendição da Campina do Taborda.
Outros exemplos podem ser citados: o da Espanha, quando da invasão dos franceses; o da China, quando da guerra contra os japoneses e na luta civil contra Chiang Kai Chek; o de Cuba, com Fidel Castro à frente, acompanhado de Che Guevara e outros valorosos combatentes.
Uma luta de guerrilhas persistente e prolongada — quando ainda não existe um exército regular de combatentes do povo — leva à formação desse Exército, se for uma luta conduzida com acerto e se condições objetivas e subjetivas o permitirem.
A luta de guerrilhas constitui assim na tática dentro da estratégia revolucionária, estratégia esta capaz de conduzir — nas condições atuais — as forças populares e nacionalistas a uma vitória.
A luta de guerrilha é uma forma de luta política. Mas é uma forma de luta política diferente — aplicável quando a luta política já não pode resolver-se pacificamente, e tem que fazer-se por outro meio. Ainda que a insurreição e a guerra civil constituam igualmente outros meios de efetuar luta política, não resta dúvida que a luta de guerrilhas tem a vantagem de poder organizar-se mais rapidamente, e com efetivos pouco numerosos a princípio. Também em qualquer momento, a luta de guerrilhas pode ser entrosada com as duas outras formas de luta referidas, quer simultaneamente, ou com cada uma delas em separado.
As forças populares e nacionalistas necessitam de um poderio. Daí que, pari passu com a luta política pelos meios ainda possíveis nas cidades, seja conveniente lançar mão da guerrilha. Por meios ainda possíveis nas cidades, entendemos as mais variadas formas de protestos e manifestações, dentro da linha de resistência de massas, mesmo que a ditadura se lance contra, reprimindo, punindo, usando da violência.
Fica subentendido que a luta de guerrilhas não é inerente às cidades, não é uma forma de luta apropriada às áreas urbanas. A luta de guerrilhas é típica do campo, das áreas rurais, onde há terreno para o movimento e onde a guerrilha pode expandir-se. Guerrilha que não se expande não preenche seu papel.
A luta política no Brasil sofreu uma mudança de qualidade. Já não há possibilidades reais de levá-la à vitória pela via eleitoral, ou através de movimento de massas destinado a pressionar o governo. Convém não confundir duas coisas distintas: a utilização de possibilidades legais e a possibilidade da vitória final.
Uma coisa é utilizar as mínimas possibilidades legais nos vários terrenos, inclusive no eleitoral e no jurídico. É sempre possível e necessário trabalhar para obter vantagens, acumular forças, dar incremento à frente única antiditadura, através de processos legais. Por mais precárias que sejam as condições, tais possibilidades mínimas jamais devem ser desprezadas.
Outra coisa, entretanto, é pretender exclusivamente através dessas possibilidades chegar à vitória final.
Desde abril de 1964 estamos sob uma ditadura militar, que emprega a violência e o terror contra o povo. Severas penas são aplicadas pelos tribunais aos lutadores e oponentes da ditadura. São penas mais pesadas que as do tempo do Estado Novo. Leis proibitivas — como a que dissolveu os partidos políticos e muitas outras — são baixadas inexoravelmente. Repetem-se os atos institucionais. As eleições e posse dos eleitos passaram a ser concessões da ditadura, que instituiu as eleições indiretas e a discriminação contra os candidatos, excluindo-os sistematicamente do preceito político legal, Com o que foi abolido o chamado sistema representativo, transformadas as eleições numa farsa. Os direitos individuais e sociais foram riscados, a Constituição rasgada e o arbítrio erigido em lei.
O poder é controlado pelos coronéis fascistas, senhores absolutos dos IPMs e principais responsáveis pela intromissão indevida e intolerável nos assuntos civis. Milhares de brasileiros — civis e militares — estão com os direitos políticos cassados e impedidos de arranjar emprego condigno. A ditadura os reduziu à condição de marginalizados.
Os detentores do poder ocupam-se em abrir IPMs, interrogar acusados, mandar prender e condenar, desobedecer ordens de habeas-corpus. Outra atividade que os empolga é decretar leis restritivas ou fascistas, obedecer aos Estados Unidos e aplicar uma política econômico-financeira de desastrosas conseqüências. Tal política paralisa o país, sobrecarrega o povo de impostos, agrava a carestia, não detém a inflação e entrega o país de portas abertas aos trustes e monopólios norte-americanos e ao governo dos Estados Unidos.
Não é difícil prever, diante deste quadro, que a situação econômico-social brasileira gera condições capazes de nos impelir às guerrilhas e à guerra civil.
Os fenômenos que se operam internamente no Brasil e que levaram à derrota das forças populares e nacionalistas, e podem agora arrastar-nos à guerrilha, não estão desligados de fatos novos, surgidos no panorama internacional, e com reflexos imediatos na América Latina e em nosso país.
Estes fatos novos decorrem da crise geral do capitalismo, em sua terceira fase, quando se equaciona o problema da libertação dos povos, em condições assinaladas pela inexistência de uma conflagração mundial. Desses fatos, um dos mais característicos é que as forças armadas, em certo número de países subdesenvolvidos ou recentemente libertados do colonialismo, se transformaram em pontos-de-apoio fundamentais do imperialismo norte-americano e das forças retrógradas internas desses países. Depois do golpe militar no Brasil, em 1964, tivemos o golpe militar da Argentina, o da Indonésia, o do Congo. É de prever que outros golpes militares sejam desencadeados, e que continue o processo de utilização das forças armadas convencionais de muitos países como instrumento principal na luta contra a democracia e contra a libertação dos povos. Em tais condições, alertados pelas ilusões numa vitória fácil com apoio das cúpulas, e despertados para o exame da falta de preparo ante os golpes militares que os apanharam de surpresa, os revolucionários — agora amargando a derrota — procurarão corrigir seus erros e passar a outras formas de luta. Alguns povos — privados da liberdade — poderão encontrar refúgio na guerrilha, deslocando a luta para as áreas rurais, abrindo uma segunda frente.
A experiência atual das lutas dos povos assinala a importância do deslocamento da ação de massas para o interior, tendo em vista a necessidade de apoiar o proletariado urbano e mudar a qualidade do movimento de oposição às forças retrógradas e à ditadura.
É no campo, entre as massas rurais, que serão encontrados os elementos, fatores e condições mais condizentes com o tipo de resistência a que somos chamados.
Tenha-se como certo que as lutas nas áreas urbanas crescerão, a despeito da repressão que lhes fará a ditadura e da perseguição que continuará movendo contra os revolucionários. Estes, porém, disseminados no campo, poderão levar o apoio das massas rurais à luta política das cidades.
Um fator favorável é que em vários países latino-americanos, onde predominam as massas camponesas e as nacionalidades índias espoliadas, as lutas de guerrilhas tendem a comprimir-se sobre a área fronteiriça de fundo do Brasil. Tal fenômeno não poderá deixar de refletir-se entre as massas rurais do nosso país.
Os revolucionários brasileiros têm como certo que a luta será decidida através da iniciativa das forças em ação dentro do país. Nada parece aprovar a idéia de uma luta de guerrilhas que não surja das entranhas do movimento camponês e do movimento de massas, da resistência do povo brasileiro. A mais perfeita identificação com os camponeses, em seus usos, costumes, trajes, psicologia, constitui fator de decisiva importância, segundo o que se conhece de mais elementar na tática de guerrilhas. Todo princípio básico deste tipo de luta tem que resultar de uma concepção identificada com a maneira de ser que resultar do povo brasileiro, com o seu próprio cerne.
A natureza peculiar da guerrilha, pelo seu cunho irregular e pelo desapego a todo e qualquer convencionalismo militar, é incompatível com princípios táticos que não encontrem por parte do povo amparo, cobertura, apoio e a mais extensa e profunda simpatia. A guerrilha tem por isso mesmo um caráter nitidamente voluntário. Qualquer tipo de coação, visando ao seu alargamento e expansão, provocará efeito contrário.
Condicionada pela sua dependência e inteira conformidade ao tipo de resistência brasileira contra a atual ditadura, a guerrilha — nas condições políticas atuais de nosso país — terá a seu encargo fustigar as forças repressivas, impelir o campo para a luta política, incentivar o camponês à luta de classe, incorporando-o à luta geral. A guerrilha é uma das formas de plantar no fundo do país a bandeira da liberdade e da luta pela terra, pelo progresso, pela independência e a quebra do domínio norte-americano, pela abolição das injustiças dos latifundiários, por um mínimo de bem-estar e melhoria para a população rural sofredora.
O Brasil é um país cercado pela atual ditadura militar entreguista e pelos círculos dirigentes norte-americanos, a cujo serviço se encontram os traidores que empolgaram o poder.
Dentro das condições desse cerco, a guerrilha brasileira — com seu conteúdo nitidamente político — não pode deixar de significar um protesto, uma referência para a elevação da luta do nosso povo. Seria imperdoável não lhe dar a necessária continuidade e durabilidade, arriscando-a a lutar onde o inimigo tem superioridade de forças concentradas ou permitindo-lhe aventurar-se a travar batalhas ou mesmo combates decisivos com as forças da reação.
Ninguém espera que a guerrilha seja o sinal para o levante popular ou para a súbita proliferação de focos insurrecionais. Nada disso. A guerrilha será o estímulo para o prosseguimento da luta de resistência por toda parte. Para o aprofundamento da luta pela formação da frente-única antiditadura. Para o esforço final da luta de conjunto, de todos os brasileiros, luta que acabará pondo por terra a ditadura.
Fonte: marxists.org
Notas do editor:
(1) Dr. Pangloss: personagem de "Cândido", de Voltaire, e encarnação de um otimismo irreal a propósito das coisas mais funestas e das piores catástrofes.
(2) A 11 de novembro de 1955, o Ministro da Guerra, Marechal Teixeira Lott, antecipando-se ao golpe de Estado que impediria a posse do Presidente eleito Juscelino Kubitschek, depõe Carlos Luz e coloca no poder o senador Nereu Ramos.
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