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O que é agitação e o que é propaganda? Algumas questões na era das mídias digitais

Gabriel Landi Fazzio

Imagem: “Agitprop – Estude, Ativista!” 1927, por Gustav Klutsis e Senkin S.Y.

Agradecemos ao camarada Gabriel Landi por disponibilizar seu texto para publicação em nosso site, consideramos este artigo uma importante contribuição para a atuação digital, e em particular a atuação de nosso coletivo, enquanto um coletivo de agitação e propaganda digital.


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“20. Nossa tarefa mais importante antes do levante revolucionário declarado é a propaganda e a agitação revolucionária. Esta atividade e sua organização é conduzida freqüentemente ainda da antiga maneira formalista. Em manifestações ocasionais, reuniões de massas e sem cuidado com o conteúdo revolucionário concreto dos discursos e panfletos.” Em “A Estrutura, os Métodos e a Ação dos Partidos Comunistas”, III Internacional, 1921.

Boa parte da militância revolucionária conhece o termo agitprop, popularizado pelos partidos comunistas da III Internacional em meio aos movimentos contra a exploração e a opressão. A agitação e a propaganda, reunidas por meio desse acrônimo, sempre tiveram um lugar de destaque em meio às tarefas da militância comunista. Como leninistas, acreditamos que a atividade fundamental de toda militância comunista “deve consistir em um trabalho de agitação política unificada; que ilumine todos os aspectos de vida e dirija-se às massas em geral”. Mas, afinal, o que é agitação, e o que é propaganda, e qual a diferença entre ambas as coisas?


Uma das melhores sínteses sobre a questão está na obra “Que Fazer?”, de Lenin. A citação pode ser um pouco longa, mas vale a pena transcrevê-la para, depois, retornarmos às várias questões que esse síntese permite levantar, em nossa época. Referindo-se à formulação de Plekhanov sobre o tema, e criticando as ideias de Martynov a respeito, Lenin repete:

“[…] as palavras de Plekhanov: ‘O propagandista inculca muitas ideias em uma única pessoa, ou em um pequeno número de pessoas; o agitador inculca apenas uma única ideia, ou um pequeno número de ideias, em troca, inculca-as em toda uma massa de pessoas’. […]
[Pensamos] (com Plekhanov e todos os dirigentes do movimento operário internacional) que um propagandista, ao tratar, por exemplo, do problema do desemprego, deve explicar a natureza capitalista das crises, mostrar o que as torna inevitáveis na sociedade moderna, mostrar a necessidade da transformação dessa sociedade em sociedade socialista etc. Em uma palavra, deve fornecer “muitas ideias”, um número tão grande de ideias que, de imediato, todas essas ideias tomadas em conjunto apenas poderão ser assimiladas por um número (relativamente) restrito de pessoas.
Tratando da mesma questão, o agitador tomará o fato mais conhecido de seus ouvintes, e o mais palpitante, por exemplo uma família de desempregados morta de fome, a indigência crescente etc., e apoiando-se sobre esse fato conhecido de todos, fará todo o esforço para dar à massa “uma única ideia”: a [ideia] da contradição absurda entre o aumento da riqueza e o aumento da miséria; esforçar-se-á para suscitar o descontentamento, a indignação da massa contra essa injustiça gritante, deixando ao propagandista o cuidado de dar uma explicação completa dessa contradição.
Por isso, o propagandista age principalmente por escrito, e o agitador de viva voz. Não se exige de um propagandista as mesmas qualidades de um agitador. Diremos que Kautsky e Lafargue, por exemplo, são propagandistas, enquanto Bebel e Guesde são agitadores.
Distinguir um terceiro domínio, ou uma terceira função da atividade prática, função que consistiria em “atrair as massas para certos atos concretos”, é o maior dos absurdos, pois o “apelo” sob forma de ato isolado, ou é o complemento natural e inevitável do tratado teórico, do folheto de propaganda, do discurso de agitação, ou é uma função pura e simples de execução.
De fato, tomemos, por exemplo, a luta atual dos sociais-democratas alemães contra os direitos alfandegários sobre os cereais. Os teóricos redigem estudos especiais sobre a política alfandegária, onde “apelam”, digamos assim, para se lutar por tratados comerciais e pela liberdade do comércio; o propagandista faz o mesmo em uma revista, e o agitador nos discursos públicos. Os “atos concretos” da massa são, nesse caso, a assinatura de uma petição endereçada ao “Reichstag” contra a majoração dos direitos alfandegários sobre os cereais. O apelo a essa ação emana indiretamente dos teóricos, dos propagandistas e dos agitadores, e diretamente dos operários que passam as listas de petição nas fábricas e domicílios particulares.”

Existem, então, dois critérios que Lenin destacada como diferenças entre a agitação e a propaganda: um critério principal, referente à “densidade do conteúdo” e à amplitude do público; e um critério acessório, relacionado à forma da comunicação (escrita ou oral).


Esmiuçando o critério principal, é oportuno desfazer algumas confusões. A começar pelo termo “propaganda”, cujo significado na tradição da social-democracia alemã (de onde Lenin e os bolcheviques aprenderam o termo) é bastante distinto do uso corriqueiro do termo, que não se pode confundir com a noção comercial e burguesa de propaganda. Na verdade, nada poderia ser mais diferente.


O conceito comercial de propaganda está muito mais próximo daquilo que chamaríamos agitação: a publicidade comercial busca inculcar em um amplo público uma única ideia bastante simples, qual seja, a ideia da utilidade e da necessidade de se consumir tal ou qual mercadoria e marca.


Enquanto a “propaganda” comercial busca tão somente promover uma empresa (construindo a credibilidade de sua marca e a crença na qualidade de suas mercadorias); a propaganda comunista busca não apenas nossa autopromoção e a divulgação de nossos símbolos (identidade visual), mas a explicação aprofundada dos fenômenos contraditórios das relações sociais existentes.


A respeito de nossa propaganda, seria preciso acrescentar: é bastante arraigado na tradição socialista brasileira o hábito de chamar de “formação” aquilo que é, no mais das vezes, propaganda. Esse péssimo hábito chega ao extremo de produzir consequências organizativas, quando separamos estes trabalhos como coisas distintas (e, com isso, no mais das vezes, tornamos nossa agitprop em pura agitação, quando não em propaganda de má qualidade).


Ocorre que, na verdade, cursos abertos, rodas de discussão, grupos de estudo públicos, palestras, etc, não são nada mais que formas não-escritas de propaganda! Quando consideramos essa atividade como “formação”, em um domínio distinto em relação à propaganda teórica, nosso trabalho nesse terreno resulta desconexo ou até mesmo “professoral”. Não raras vezes, essas “formações” dão aos ouvintes interessantes conhecimentos teóricos, mas que não lhes conduzem muito seguramente à conclusão de concepções política revolucionárias. Como toda propaganda, essas “formações” também não podem se perder em escolasticismo, e devem estabelecer com nitidez a relação existente entre a teoria propagada e a estratégia, a tática, o programa, em suma, as concepções teóricas aplicadas à prática que são produto das luta ideológica comum do intelectual coletivo partidário.


Uma outra coisa distinta é a formação de quadros propriamente dita (a preparação de propagandistas, agitadores, organizadores, etc). Aqui, com efeito, o aprofundamento polêmico pode ultrapassar a finalidade de propaganda revolucionária – pois, presume-se, trata-se de aprofundar a formação de militantes que já se dedicam efetivamente ao trabalho político sob uma perspectiva revolucionária. No entanto, também isso é prejudicado quando se faz uma má propaganda a título de “formação” e, então, dá-se por cumprido o trabalho formativo dos quadros. A verdadeira formação fica, assim, relegada a um segundo plano – ou, por vezes, realizada puramente em sua dimensão técnica (basta ver como as oficinas de produção audiovisual ou de edição, por exemplo, quase sempre ocorrem desacompanhadas da formação política dos quadros técnicos da comunicação). Entre essas dimensões técnicas, a preparação na arte da oratória costuma ser bastante negligenciada, como se fosse uma mera questão de aptidão nata, dispensando qualquer aprimoramento e desenvolvimento. [1]


Outro engano corrente é aquele mesmo que Lenin critica na definição dada por Martynov para a agitação. Muitos camaradas consideram que a agitação significaria o plano da comunicação voltado ao “chamado à ação”. Mas, como Lenin aponta, “o ‘apelo’ sob forma de ato isolado, ou é o complemento natural e inevitável do tratado teórico, do folheto de propaganda, do discurso de agitação, ou é uma função pura e simples de execução.” Tanto a agitação quanto a propaganda (se não queremos ser meros falastrões professorais, mas propagandistas revolucionários) devem infundir o espírito de combate e de ação em nossos espectadores.


Tomar esse critério para definir nossa agitação significaria, por um lado, negligenciar o aspecto do “chamado à ação” em nossa propaganda; tanto quanto o aspecto de “luta ideológica” de nossa agitação. É digno de nota, a esse respeito, o exemplo de agitação oferecido por Lenin, que trata não de alguma injustiça ou arbitrariedade pontual, mas justamente de um dos traços da contradição fundamental da sociabilidade capitalista: a contradição entre a crescente socialização da produção e a crescente concentração da propriedade, que se expressa, entre outras coisas, no simultâneo crescimento da riqueza e da miséria social. O agitador, tanto quanto o propagandista, faz “luta de classes na filosofia” e, ainda mais importante, faz luta ideológica de massas, e não apenas nos meios mais intelectualizados.


Feitos esses apontamentos em torno do critério principal, resta analisar o critério acessório (“o propagandista age principalmente por escrito, e o agitador de viva voz“). Lenin pronuncia com nitidez o caráter secundário deste critério (por isso fala “principalmente”, e não de modo absoluto). Mesmo à sua época, já circulavam impressos de caráter eminentemente agitativo (caráter que também se pode atribuir às charges impressas, por exemplo, desde os cartazes e panfletos da época da Revolução Francesa). Do mesmo modo, os propagandistas já atuavam também por meios orais, especialmente por meio de palestras itinerantes (os “propagandistas volantes”, que Lenin menciona em “Carta a um camarada”).


No entanto, entre a época de Lenin e a nossa há um século de grandes revolucionamentos nos meios técnicos de produção e difusão da comunicação. Tais modificações nos meios de comunicação contribuíram para tornar esse critério acessório de diferenciação cada vez menos apropriado.


Isso ocorre, primeiramente, porque surgiram novos meios de formalização, de registro da comunicação. Uma palestra de um propagandista, tanto quanto o discurso de um agitador, podem ser gravados e reproduzidos infinitas vezes, necessitando ser proferidos uma única vez. Tornou-se possível editar essas mesmas comunicações orais de modo a complementá-las com imagens, que demonstrem graficamente aquilo que o discurso enuncia. A “agitação oral” hoje também pode ser feita por meio de áudios em grupos de mensagens, etc. Ao mesmo tempo, se as imagens desempenhavam um papel secundário nas publicações impressas, adquirem, em especial nas mídias digitais, o papel de principal veículo de conteúdos textuais (sejam os “memes” ou mesmo as mais simples frases diagramadas em meio às fotos).


Em segundo lugar, em especial após o advento da Internet, modificaram-se significativamente os aspectos de nosso trabalho de “distribuição de literatura”. Há um século, seria praticamente impossível obter contato com a literatura comunista senão através do trabalho partidário de distribuição de literatura. Se o próprio mercado editorial já passou a suprir parte desta demanda, a Internet modificou definitivamente a dificuldade material de acesso à literatura revolucionária – vejamos, por exemplo, o brilhante trabalho de portais como o www.marxists.org.


Mas qual o interesse em insistir nessa questão? Ora, na Era da Prensa, a época em que os meios técnicos permitiam sustentar aquele critério acessório de diferenciação com alguma segurança; esta distinção era um ponto de apoio para a divisão especializada do trabalho nas organizações revolucionárias. Enquanto os agitadores se qualificavam como oradores, os propagandistas se preparavam para desempenhar o papel de publicistas e redatores. Em ambos os casos, esses e essas camaradas eram coletivamente destacadas e coordenadas nestas tarefas.


E hoje? Cada vez mais as fronteiras entre a agitação e a propaganda se confundem. Virtualmente, como todo cidadão se tornou um “jornalista” por meio de seu perfil online, também todo militante se tornou um publicista digital. Com o acesso facilitado aos meios de publicação, em seus perfis pessoais, muitos camaradas buscam atuar duplamente como agitadores e propagandistas, sem preparo especializado – e mesmo a criação de diversas “páginas” virtuais é produto de ações isoladas, sem conexão orgânica.


Ainda mais: como as mídias digitais são uma via interativa de mão dupla, é muito comum que a agitação e a propaganda ocorram desordenadamente, passando de uma à outra sem muito cuidado e reflexão. Um exemplo: se algum camarada publica uma peça de agitação e é interpelado, nos comentários da postagem, sobre alguma questão mais complexa, rapidamente buscará respondê-la, mesmo sem grande domínio do tema. Com isso, se substitui precariamente a prévia preparação do propagandista pela pesquisa imediata, em busca de fontes que respaldem uma reposta previamente concebida.


Dialogamos com dezenas de interlocutores em um mesmo debate, negligenciando seus níveis desiguais de consciência e suas diferentes posições materiais e políticas. Respondemos raivosamente tanto ao pequeno burguês reacionário que sequer mereceria atenção quanto ao trabalhador entorpecido pelo bombardeio midiático de mentiras. Esquece-se que, naturalmente, quanto mais profunda a explicação e mais complexo o tema, menos provável que seja absorvida por “muitas pessoas”, ainda mais em um ambiente desvinculado de qualquer experiência efetiva de organização e luta de massas. Contudo, não importa o quão amplamente as novas mídias permitam que nossa comunicação se espalhe: a distinção entre níveis de compreensão nas várias camadas da classe trabalhadora segue existindo, e não de elimina senão pela combinação consistente entre participação efetiva nas lutas de classes e a influência, paciente e prolongada, de toda a propaganda socialista! Ignorando essa verdade, muitos camaradas se afobam e buscam coagir os interlocutores a aceitar as verdades do marxismo, a golpes de ironia, ofensas e desdém. [2] O dogmatismo nunca esteve tão em alta, talvez, quanto na época em que basta linkar uma citação direto da fonte para atestar a veracidade de uma posição.


Talvez seja ainda mais importante do que nunca insistir, portanto, na questão da paciência na propaganda, já manifestada por Lenin: “Para não deixar nenhuma sombra de dúvida neste tocante, eu enfatizei por duas vezes nas Teses [de Abril] a necessidade de um trabalho “explicativo” paciente e persistente, adaptado às necessidades práticas das massas”. Quando os bolcheviques eram acusados caluniosamente de serem “agentes dos interesses alemães”, Lenin insistia que, “desmentindo a farsa e a difamação, devemos, com mais calma que nunca” pensar a fundo nas questões, sem nos bastar nas respostas prontas impacientes.


Essa afobação desordenada não apenas enfraquece a agitação (passando ela para um plano secundário), como produz efeitos danosos no plano da propaganda, agravando a dispersão de nosso “trabalho explicativo”. E, na verdade, a centralização da propaganda é um dos desafios fundamentais da organização revolucionária, e a condição da própria unidade na agitação.


Quando vemos o tipo de preocupação que, já à época de Lenin, a organização dos propagandistas provocava, não é difícil compreender como a dinâmica digital ajuda a encubar os piores hábitos liberais de nossos intelectuais e publicistas de esquerda (em “Carta a um camarada”):


“A propaganda deverá ser feita de forma uníssona por todo o comitê, a quem corresponde centralizá-la rigorosamente. (…)
Quanto aos propagandistas, ainda gostaria de dizer algumas palavras contra a tendência usual de abarrotar essa profissão com pessoas pouco capazes rebaixando com isso, o nível da propaganda. Às vezes, entre nós, qualquer estudante indiscriminadamente é considerado propagandista, e todos os jovens exigem que se lhes “dê um círculo”, etc. Temos que lutar contra essa prática, pois são muitos os males que daí advém. As pessoas realmente firmes quanto aos princípios, e capazes de ser propagandistas são muito poucas (e para chegar a sê-lo é preciso estudar muito e acumular experiência), e a estas pessoas é necessário especializá-las, ocupar-se delas e cuidá-las com zelo. É preciso organizar várias aulas por semana para esse tipo de pessoas, saber enviá-las oportunamente a outra cidade e, no geral, organizar visitas dos mais hábeis propagandistas pelas diversas cidades.”

Se é verdade que as mídias digitais permitem ampliar a abrangência do nosso trabalho de massas, incumbindo contingentes cada vez maiores de quadros na produção e distribuição de nossa agitação e propaganda – então, organizar de modo consequente e planejado a atuação dispersa de centenas de militantes é uma das questões candentes de nosso movimento, no século XXI.


Ainda estamos reagindo à chamada “crise do jornalismo”. Não apenas ainda organizamos de forma insuficiente nossa atuação virtual como permitimos, muitas vezes, que essa desorganização nos atinja no plano do trabalho físico (refletindo na distribuição dos jornais impressos, na correspondência e na literatura partidária, nos contatos entre os organismos e militantes, etc).


Retomar a discussão aberta sobre nossa agitação e nossa propaganda é um ponto de partida inevitável. Só assim poderemos aproveitar as oportunidades [3] que esses novos veículos abrem, assegurando nossa unidade de ação e, ao mesmo tempo, ampliando também a consistência de nossas redes orgânicas, físicas, de distribuição de panfletos, jornais, comunicados, etc. Não basta que um debate efêmero venha à tona a cada nova situação (cada novo caso problemático de agitação e propaganda virtual, cada nova confusão na resposta aos eventos da conjuntura, etc). O ponto de partida para organizar de nosso trabalho comum na luta ideológica deve ser a própria organização da discussão sobre os dilemas de nossa luta ideológica diante dos desafios da comunicação digital. De nenhum outro modo poderemos sistematizar as experiências já existentes rumo a uma atuação planejada e sistemática, que escape à reatividade.


 

Notas de Rodapé:

[1] Outra questão sobre a qual valeria uma reflexão, ligada a este tema terminológico da “formação”, é a distinção entre o “trabalho de base”, termo corrente entre nós, e o “trabalho de massas”, conforme formulado por Lenin. Não se trata apenas de uma diferente escolha de palavras: enquanto o trabalho de massas compreende a agitação e a propaganda de modo integrado, concebido à escala geral de todo um país (um trabalho que demanda ações locais, mas concebido à escala de massas); o trabalho de base pode muito bem existir de modo localizado, sem qualquer perspectiva programática integral, sem exigir a conjugação de diferentes esforços e áreas de atuação, etc. Por isso mesmo, talvez, todo o falatório tão presente na esquerda há uma década sobre a “falta de trabalho de base” não tenha levado a grandes soluções: agrava a dispersão, empurra a militância para as diversas frentes locais de atuação cotidiana, sem muito bem sanar as debilidades da esquerda na luta ideológica em um plano mais geral e unitário. Sem dúvida alguma o trabalho pedagógico à escala local é uma necessidade primária no trabalho de organização, agitação e propaganda. Mas não devemos relegar o próprio trabalho de coordenação dos propagandistas, agitadores e organizadores atuando entre as massas (“na base”) como um trabalho desprezível, menor, burocrático, etc.


O “trabalho de base” aparece no discurso corrente como a panaceia contra o distanciamento entre dirigentes e dirigidos, e como cura contra a pura ação performática. Mas nenhuma agitação pode prescindir de alguma dose de performance. Seria um despropósito extrair, da crítica da ação performática, uma negação da importância de ações como o teatro político de rua, por exemplo. Nesse sentido, a crítica da ação performática deve frisar muito mais a falta de consequência na luta ideológica do que um repúdio de tal ou qual forma de agitação e propaganda. Uma ação é meramente performática não porque é também performática, e sim porque lhe falta conexão com um planejamento mais amplo e sistemático, associado ao conjunto do trabalho de propaganda e de organização.


[2] Abordei alguns aspectos dessa questão em um texto anterior: ““Não sou obrigado”: impaciência e arrogância na esquerda”.


[3] A esse respeito, é bastante interessante observar os apontamentos dos camaradas do PTB belga.

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